Passeio Secreto
Eu já tinha mais de 40 anos na primeira vez que viajei aos Estados Unidos. Durante minha vida até então, aquele país foi referência de liberdade de expressão, informação, ação. Vivi a juventude sob o poder da ditadura militar, que tanto prejudicou o desenvolvimento do Brasil na segunda metade do século passado, e os EUA eram referência de uma sociedade desenvolvida e livre (na minha cabeça!).
Até então, Che Guevara, Marx, Cuba e a revolução eram referências de ordem ética. Estive em Cuba, depois da Ditadura, e vi muitas crianças lindas, sorridentes, felizes. Havia escolas, hospitais em cada bairro. Os carros eram horríveis, mas ninguém ligava. As pessoas eram felizes, mas não tinham livre acesso à informação. Canal de tevê controlado pelo Estado.
Mas ir aos Estados Unidos, ou América, como eles se chamam, só aconteceu em 2002. Justo depois do terrível Nine Eleven, que mudou tudo por lá. Autoconfiança virou raiva, medo, perdas e guerras. Aqui a gente coloca portões e travas de segurança.
Nos EUA não há portões. Há porte livre de armas. O sujeito tem o direito constitucional de ter arma para sua defesa. Até mesmo contra o Estado. Eles chamam isso de liberdade. Violência e armamento é um problema sério no país, em minha opinião.
Agora, ainda bem, Yes we can! Obama é o máximo, Prêmio Nobel da Paz! Inteligente, lindo, tem traquejo e usa a internet melhor do que já se viu no mundo. Eu estava lá quando ele deu sua primeira grande entrevista de internet, precedida pela da tevê, na noite anterior. Falou que a crise é brava mesmo e que seu projeto é investir em educação e energia alternativa. Usamos celulares, computadores, tudo novo, mas continuamos com os sistemas de energia de 100 anos atrás, ele ponderou. Nessa mesma visita à então capital mundial, fui convidada para almoçar no Pentágono. Centro estratégico de armamento do American Army. Foi lá o segundo maior número de vítimas do ataque de onze de setembro. O coronel que nos convidou estava no local no dia da explosão e andou quilômetros enquanto respirava o que estava acontecendo. Contou-nos em sua sala, que dá de frente para o memorial.
O Pentágono é imenso. Superinteressante, dos fardados à cozinha, e ao elegante restaurante. Curioso que um de meus anfitriões, Francesco Abbruzzetti, famoso pela Trattoria da Franco (www.trattoriadafranco.com), foi tão sincero com o “coronelo” que reclamou da qualidade inferior da cozinha do restaurante do Pentágono… Ele, aliás, mostrou ser bem conhecido naquela Casa. Encontrou vários amigos…
Fiquei tão entusiasmada com todos os acontecimentos que pedi permissão para fotografar, o que me foi concedido. Delícia! Tirei foto de tudo que vi pela frente naquele Pentágono tão curioso quanto poderoso. Tudo ia tão bem até que chegamos à porta para o metrô – há uma saída que dá direto em uma estação. Supervigiada. Segurança máxima.
Do alto da escada rolante, olhei para aquela parede imensa, abaixo das escadas. Uma inscrição linda e enorme: Pentagon… em ouro, parece. Viajei, cliquei duas vezes minha máquina, para acertar melhor o ângulo.
Quando olhei para o lado, havia vários fuzis apontados diretamente para mim e para meu já desesperado anfitrião! Entreguei a máquina ao segurança, pedi milhões de desculpas, mas ele insistia que o caso iria para a CIA. Chamou seu superior. Meu mais superior ainda anfitrião, a mercê da segurança máxima, exigiu apenas que tudo ficasse completamente esclarecido ali mesmo. Todos os documentos, meu passaporte, as credenciais dele, a máquina — deram uma blitz e apagaram as fotos consideradas de risco, como a dos oficiais no banco e outras… Contudo, esse passeio tão secreto ninguém pode deletar de minhas lembranças…