O mar de Omã

Era muito nova quando assisti a Lawrence da Arábia pela primeira vez, mas, apesar da pouca idade, algumas de suas cenas ficaram para sempre gravadas na minha memória, em especial a chama do palito de fósforo que se transforma no sol do deserto que tanto fascinou o verdadeiro T. E. Lawrence.

Todo esse amor “lawrenciano” pelo deserto pude vivenciar em um país que quase ninguém visita: Omã. Acredito que, por pura ignorância, porque se trata de um lugar que reúne, em um território relativamente pequeno, atrações tão díspares como um deserto de dunas gigantes, cadeias de montanhas, fiordes, cânions, antiquíssimos sistemas de irrigação tombados pela Unesco, uma capital histórica e que ainda preserva as tradições, praias com resorts luxuosíssimos etc. 

Omã se trata de um sultanato localizado no sul da Península Arábica, ao lado do Yêmen, com quem divide características comuns. Ao contrário, porém, de seu vizinho, Omã é um país pacífico e seguro, tão seguro que consegui reaver, mais de duas horas depois, uma sacola de compras esquecida dentro de um shopping. 

Sua capital é Muscat, um importante entreposto comercial de Portugal na época dos grandes descobrimentos. Ao contrário dos prédios exóticos e gigantescos de Dubai, em Muscat estão proibidos os prédios altos e que fujam ao estilo arquitetônico árabe. Sua principal mesquita, a Grande Mesquita do Sultão Qaboos, juntamente com o Palácio Al Alam e a Ópera de Muscat impressionam não só pela beleza, mas também pela limpeza que faz o chão de mármore brilhar até mesmo nas suas áreas externas. E para quem pensa que os muçulmanos são muito diferentes de nós, basta ir à praia Al Qurum em uma sexta-feira para perceber que embaixo daqueles lenços vermelhos masculinos e dentro das “abayas” negras femininas também bate um coração paquerador. 

Apesar de não ser aconselhável usar biquínis nas praias públicas, eles são liberados nas praias onde estão os resorts. Eu preferi mesmo ficar nas cadeiras (na verdade, camas king size) da piscina cinematográfica do Hotel The Chedi, bebendo a água aromatizada e geladinha que era servida a toda hora pelo garçom. A partir de Muscat também se pode fazer passeios de barco para apreciar a cidade de outro ângulo, mergulhar ao redor das Ilhas Daymaniyat ou ver os golfinhos. 

Também dá para pegar o avião ou a balsa para a Península de Musandam, uma parte do território omani separada do restante do país e que está localizada na pontinha da Península Arábica. De lá, pode-se avistar o Irã do outro lado do Golfo Pérsico e explorar os khors (fiordes) por meio de cruzeiros de dhow, o barco típico da região. 

No interior do país, destaca-se a cidade antiga de Nizwa, que possui um forte totalmente preservado e um souq bem mais autêntico do que outros que já visitei. Até mesmo um mercado de cabras é realizado no local, toda sexta-feira. 

Já na estrada, seguindo em direção às montanhas, estão espalhadas várias cidades de tijolos de argila, que costumava ser o método tradicional de construção. A que mais vale a pena visitar é, com certeza, a de Misfat al Abryeen, encravada numa montanha e que, juntamente com a plantação de palmeiras logo abaixo, forma um cenário deslumbrante e meio surreal. 

Continuando pelo interior, chega-se ao Platô de Saiq, com montanhas, como Jebel Shams, que chegam a ter 3.000 metros de altitude. De cima do platô se tem uma vista dos lugarejos espalhados pelas montanhas, interligados por trilhas de trekking que também dão acesso ao falaj, antigo sistema de irrigação de origem pré-histórica que funciona até hoje. 

Ainda há no país cavernas e cânions que foram formados há milhões de anos pelos wadis (leitos de rio). O que mais gostei foi o Wadi Arbayeen, mas há outros que podem ser visitados, como o Wadi Bani Khalid, em que se pode almoçar, nadar, visitar cavernas ou simplesmente relaxar em uma das redes espalhadas pelo local. 

Mudando totalmente de ambiente, o Deserto de Wahiba integra tudo aquilo que sempre havia imaginado de um deserto: dunas imensas onde os carros 4X4 podem brincar de montanha-

russa, caravanas de camelos, grupos de cabras pastorando e tendas de beduínos. Uma noite dormindo em um dos acampamentos no deserto é inesquecível. Um silêncio absoluto com todas aquelas estrelas que nós, moradores de São Paulo, nem sabemos que existem mais. E finalmente eu pude assistir a um pôr do sol digno de um filme do David Lean, mergulhando meus pés naquele mar de areia ainda quente e de cor laranja. 

A experiência mais divertida que tive foi ao visitar a tenda de uma família beduína. Os beduínos são conhecidos pela hospitalidade, e já faz parte da tradição oferecer aos visitantes chá e tâmaras. Mas esta família também era muito brincalhona e ficava provocando um ao outro o tempo todo. Logo quando cheguei, a filhinha do casal pediu para colocar os meus óculos escuros. O pai disse que, como ela não estava se comportando bem, iria dá-la para mim. E a colocou dentro de uma caixa de papelão, de onde ela saiu gargalhando. Quase que eu a trouxe mesmo para casa!

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