Nina Orlow

A arquiteta urbanista e pós-graduada em Gestão Ambiental é uma das mais importantes incentivadoras, aqui no Brasil, da Agenda 21, um dos compromissos firmados pelos vários países que participaram da ECO 92, Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD). A seguir, entenda um pouco mais esse projeto, conheça as propostas que foram enviadas à subprefeitura Vila Mariana e saiba como podemos ajudar o planeta e o nosso bairro

Pedaço da Vila: Você é arquiteta urbanista por formação, mas se especializou em gestão ambiental. Conte-nos sua história.

Nina Orlow: Já trabalhei em várias áreas. Exerci por muito tempo arquitetura e urbanismo atuando muito na área social. Recentemente, fiz curso de Pós-Graduação em Gestão Ambiental, no SENAC, onde dois professores tiveram muita influência nas minhas escolhas: os professores Fábio Cascino e Mônica Simons. Ensinaram-me a importância de um novo olhar e da visão integrada para ações que divulgo sempre nas minhas palestras. A partir desse curso resolvi atuar de alguma forma com os conteúdos socioambientais. Conhecendo os preceitos da Agenda 21 e do instrumento Passo a Passo da Agenda 21 Local, passei a divulgar sua implementação.

P.daVila: Quando surgiu o termo “Desenvolvimento Sustentável”?

N.O.: Precisamos reconhecer que, no século passado, houve várias iniciativas preocupadas com os rumos do desenvolvimento. Foi proposta pela ONU uma Comissão, coordenada por Gro Brundtland da Noruega, para estudar e sistematizar um diagnóstico da situação socioeconômica no mundo. Isso resultou em 1987 no relatório “Nosso Futuro Comum”, que criou esse termo“Desenvolvimento Sustentável”. Ele propôs que a condição de bem estar das pessoas que vivem hoje deve ser garantida, ou melhorada para as futuras gerações, equilibrando o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental.

P.daVila: O que é a Agenda 21?

N.O.: Agenda 21 foi um dos documentos assinados na ECO 92, a Conferênciadas Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), que ocorreu no Rio de Janeiro. Foi um dos encontros mais importantes de representantes de países que firmaram vários compromissos em nível global. O documento Agenda 21 Global é um deles, tem 40 capítulos e sinalizou a importância dos planos e ações integrarem meio ambiente, desenvolvimento econômico e, princi-palmente, a justiça social. Foi a primeira ocasião que a humanidade se deu conta do crescimento da pobreza no mundo e o enorme prejuízo do que a falta do cuidado ambiental pode ocasionar.

P.daVila: Você é responsável por qual região?

N.O.: O trabalho das Agendas 21 Locais funciona em rede e os responsáveis pelo sucesso são todos os participantes. Isso não é fácil de compreender e até de por em prática, pois hoje a maior parte das estruturas de relacionamentos são verticalizadas. Trabalhar em redes ainda é um desafio, mas os avanços são gratificantes. Percebo que faço parte de um grupo e que só faz sentido a minha contribuição por causa da participação de todos os integrantes. A única diferença que tenho é maior disponibilidade para dedicação, o que aumenta a responsabilidade de contribuir. Tenho atuado mais na região Sul da cidade e na Vila Mariana, além de incentivar processos de Agenda 21 nos Municípios do Estado de São Paulo.

P.daVila: Qual é a proposta da Agenda 21?

N.O.: Após a ECO 92, vários signatários do documento aprofundaram estudos e propostas para seus países e o Brasil também fez a sua lição de casa promovendo amplo debate que resultou em documentos com propostas para Agenda 21 brasileira. Porém na prática foi observado que, conforme o capítulo 28, da Agenda 21 Global, só iremos evoluir no sentido do tripé da sustentabilidade – ambiental, social e econômico – se tivermos práticas locais: comunidade e governo pensando e agindo para melhorar a condição de vida localmente.

P.daVila: Quais são as ações prioritárias da Agenda 21 e como isso é feito?

N.O.: Para ajudar na compreensão e implementação do processo foi criado um instrumento pelo Ministério do Meio Ambiente, que é o “Passo a passo da Agenda 21 Local”, com seis passos que são a base condutora dos trabalhos: 1- Mobilizar para sensibilizar governo e sociedade; 2 – Criar um Fórum de Agenda 21 Local; 3 – Elaborar um diagnóstico participativo; 4- Elaborar o plano de desenvolvimento sustentável; 5 e 6 – Implementar e monitorar o Plano. Esse instrumento ajuda a homogeneizar os trabalhos de várias regiões, permite o respeito à diversidade das características locais.

P.daVila: Quais são as dificuldades em implementá-la na cidade de São Paulo? E por quê?

N.O.: Acredito que em São Paulo estamos superando uma dificuldade importante de se ter no mínimo 31 processos de Agenda 21 Local, um em cada Subprefeitura. Podemos considerar na capital praticamente 31 municípios de médio e grande porte onde cada subprefeito deve ser considerado praticamente o “prefeito dessa cidade” afim de trabalhar junto com a sua comunidade para facilitar a vida dos cidadãos. Isso significa ter o máximo de os serviços à disposição nas próprias subprefeituras e a construção de políticas locais de forma participativa e transparente. Nem todas tem os fóruns de Agenda 21 ou Conselhos de Meio Ambiente regionais instituídos e temos esse desafio de iniciar essa mobilização através dos cidadãos ou de instâncias do governo local.

P.daVila: O poder público contribui de que

maneira com a Agenda 21? Há dificuldades ou já foi estabelecida colaboração para a criação de políticas públicas em prol do meio ambiente?

N.O.: A Agenda 21 Local é um processo que depende da comunidade e do governo local. Se um dos lados estiver com problemas, criam-se entraves para avanços.De forma geral, infelizmente as políticas públicas ainda não incorporaram a transversalidade que a Agenda 21 Global propôs. As políticas para o Meio Ambiente devem ser implantadas por todos os órgãos e instituições. Passados 17 anos da Eco 92, e mesmo com novas constatações da importância da responsabilidade do ser humano com o seu ambiente, como as mudanças climáticas , ainda estamos longe de incorporar práticas de sustentabilidade real. O poder econômico imediatista tem falado mais alto no mundo.

P.daVila: Como a sub-prefeitura VM colabora com a Agenda 21?

N.O.: A Vila Mariana já teve em 2000 uma Agenda 21 Local. Após alguns anos esse fórum se desfez. A partir de 2007 foram feitas várias tentativas para iniciar novo processo e a UNIFESP teve uma importância nessa retomada, a partir do curso “Agenda 21 na Unifesp”. Diferentemente de outras Subprefeituras da região Sul, não tivemos sucesso em envolver a Subprefeitura de Vila Mariana. Mesmo assim, comunidade local e alguns técnicos resolveram iniciar o Fórum de Agenda 21 e fomos acolhidos pela SVMA, Secretaria dos Esportes e Secretaria da Educação. Com a nova gestão na Subprefeitura esse ano, passamos a ter o apoio para o processo de Agenda 21 Local, inclusive com a eleição do CADES-VM. No mês de agosto respondemos a uma pesquisa sobre processos de Agendas 21 locais para o Ministério do Meio Ambiente e o questionário preenchido de forma coletiva foi enviado para o subprefeito Mauricio Pinterich.

P.daVila: Quais as propostas que a Agenda 21 fez à subprefeitura de Vila Mariana?

N.O.: Alguns integrantes do Fórum de Agenda 21 de Vila Mariana, técnicos da prefeitura e pessoas da comunidade já tinham experiência em Agenda 21 de outras regiões da cidade e conheciam a dinâmica do “Passo a Passo.” Os demais participantes foram logo se apropriando do processo e formulando propostas, a partir das percepções locais. Foi considerado fundamental o aprofundamento do diagnóstico local – 3º passo da Agenda 21 local. Os distritos são historicamente tratados de forma desigual nas prioridades para investimentos e melhorias. Também foi importante a análise dos indicadores da região, compilados pelo Movimento Nossa São Paulo, e comparados com as áreas vizinhas. Os distritos de Vila Mariana estão na passagem entre periferia e centro e sofrem com esse impacto. A falta de uma Central de Triagem para a coleta seletiva também é um problema grave na região, pois a comunidade de Vila Mariana gera muitos resíduos com material que pode ser muito bem aproveitados para a reciclagem, além de gerar oportunidades de trabalho e renda para os catadores, sem esquecer do fundamental: que é repensar o consumo. Outros assuntos que foram prioritários na discussão: o Plano de Metas, o Orçamento Público (PPA) e os editais do FEMA- Fundo Social do Meio Ambiente . São recursos importantes para nossa região e precisamos participar das propostas e dos encaminhamentos. Foi criado também o início de Agenda 21 na Unipaulistana, e a possibilidade muito bem-vinda de integrar os universitários com as atividades nas escolas da região. Questões urbanas também tiveram destaque: a problemática da drenagem pluvial mal resolvida, o sistema viário, a falta de boa rede de ciclovias e as hortas urbanas nos espaços públicos e privados vazios.

P.daVila: Como moradora da região, fale sobre as maiores necessidades do bairro.

N.O.: A nossa região é bastante diversificada. Tem grandes áreas de complexos de saúde, muitas universidades, áreas gastronômicas e de comércio. A pressão imobiliária traz aspectos pouco planejados para o sistema viário, entraves na drenagem e no subsolo. Infelizmente a nossa região é o reflexo da opção da cidade pelo transporte individual motorizado, e o pedestre tornou-se ator secundário. A vinda do Metrô, com muito atraso em relação a outras cidades no mundo, certamente irá alterar o desenho da região, e como cidadãos, devemos também ficar atentos aos impactos que o Metrô gera, durante a construção e depois da operação, exigindo no entorno das obras a priorização ao pedestre.

P.daVila: Como cada pessoa pode contribuir com o Planeta? E como participar da Agenda 21?

N.O.: Temos várias formas de contribuir para melhoria da qualidade de vida no Planeta. Cada pessoa tem também limitações de disponibilidade de tempo, financeira ou até de informações. O mais importante é ter vontade de contribuir: desimpermeabilizando a sua calçada, cuidando do seu jardim ou de áreas comuns, tratando do seu resíduo ao fazer a coleta seletiva, aprendendo a compostagem, prestando atenção para não desperdiçar alimentos, aprender a alimentar-se corretamente, dar preferência aos produtos orgânicos, plantar hortas e temperos em vasoster cuidado para não desperdiçar a água, nosso bem maior. Também podemos contribuir com iniciativas que melhoram a nossa cidade, como o Movimento Nossa São Paulo (www.nossasaopaulo.org.br). A iniciativa da Agenda 21 Local permite que a nossa participação contribua para construção de políticas públicas. Na Vila Mariana as reuniões acontecem toda segunda feira de cada mês na subprefeitura de Vila Mariana: rua José de Magalhães, 500, às 14h. Todos são bem-vindos!

Edição 87 – Set/2009

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