Campo Minado!!!

No meio do caminho havia um saquinho, havia um saquinho no meio do caminho. Se essa frase fizesse parte de um poema, certamente o autor teria se inspirado nas calçadas da Vila Mariana. Não é de hoje que a tarefa de se locomover pelo bairro se transformou em uma brincadeira de campo minado. Não bastasse o problema das calçadas irregulares, cheias de desníveis provocados por degraus e raízes de árvores, todos os dias incontáveis saquinhos cheios de cocô de cachorro são jogados no passeio público. O fato causa mal-estar e uma eterna discussão entre os moradores do bairro: a culpa é de quem, da falta de lixeiras pelas ruas ou do descomprometimento dos donos de cães?

A situação, que já era ruim, ficou pior ainda com o sumiço — há mais de dois meses — das lixeiras públicas colocadas nos postes. Em contato com a subprefeitura, fomos informados de que até o final deste mês todas essas lixeiras serão recolocadas e que tal procedimento ainda não foi realizado pela falta de presilhas para afixá-las no local correto.

Quem passeia frequentemente com os cães pelo pedaço se sente prejudicado com a demora: “Saio quatro vezes por dia com o minha cachorra e acho dever da prefeitura disponibilizar meios para que possamos depositar a sujeira. Fala-se muito na lei Cidade Limpa, mas não há cidade limpa sem olhar para baixo, para a imundice que estão as ruas. Certa vez liguei na subprefeitura para solicitar providências e disseram para eu voltar com o cocô para casa e jogar na privada. Acho isso um absurdo”, revolta-se Zeca Atala, músico e morador do bairro há 45 anos.

Por outro lado, há quem acredite que a irresponsabilidade de alguns donos também contribui para piorar essa situação. Maria Amélia de Siqueira Corrêa, moradora do bairro há 40 anos, já perdeu a conta de quantas vezes precisou limpar a frente de casa que estava cheia de cocô: “Eu adoro animais, mas tenho certeza de que as pessoas que deixam o cachorro fazer as necessidades na minha porta não gostariam que fizessem isso na porta da casa delas. É uma questão de saúde pública. Muitas vezes acabo entrando com o carro na garagem e a roda passa em cima de algum cocô, levando sujeira e mal cheiro para dentro da minha casa”.

Os moradores prejudicados que, assim como Maria Amélia, têm a calçada diariamente invadida pela sujeira dos animais, tentam de todas as formas educar e alertar os donos de cães, inclusive com plaquinhas em muros, postes e árvores. Algumas alertam sobre a Lei Municipal nº 13.131, de 18 de maio de 2001, que “obriga o condutor do animal a recolher os dejetos fecais eliminados em vias e logradouros públicos, sob pagamento de multa de R$10 em caso de autuação”. Mas quem conhece alguém que já tenha sido penalizado por essa lei?

Para tentar amenizar o problema, alguns edifícios e comércios resolveram, por conta própria, afixar lixeiras próximas às suas calçadas. É o caso do Edifício Palmas de Mariana, que fica na rua Rino Pieralini, 175, que desde 2008 disponibiliza materiais para os moradores recolherem e depositarem a sujeira dos animais: “As pessoas saem com os cachorros, mas não têm opções para descartar o lixo recolhido. Isso acontece no bairro todo. Por isso resolvemos tomar uma atitude pelo menos por aqui. Acredito que se todos os responsáveis pelos edifícios pensarem assim, a situação das calçadas melhoraria significativamente”, torce Eliane Viera, síndica e autora da ideia no condomínio.

Como a maioria das lixeiras tem formato redondo, dificultando a fixação em superfícies planas, como um portão, por exemplo, o Pedaço da Vila buscou resolver o problema e encontrou uma solução para facilitar a iniciativa: um modelo de lixeira criado por Nilo Ferreira, morador do bairro há mais de 50 anos, dono de uma fábrica que produz artefatos de metal e apaixonado por cães. “Há dois anos lançamos o saquinho preto da Pró-Bicho para as pessoas recolherem a sujeira. Percebemos então que, após o uso, ele era descartado na calçada. Resolvemos criar uma lixeira de plástico, mas ela não deu certo por ser muito frágil e pequena. Foi aí que surgiu, recentemente, a ideia de fazer esse novo modelo, que tem um dos lados reto e é mais fácil de fixar.”

A lixeira foi desenvolvida em sua fábrica, feita de arame galvanizado (confira as especificações ao lado), com a promessa de ser vendida a preço de custo para os moradores do pedaço. Parte do valor obtido com as vendas será utilizado por Nilo para cuidar dos mais de 80 cães que ele mantém em seu sítio no interior de São Paulo: “É importante as pessoas pegarem o saquinho com o cocô e jogar no lixo. Joga-lo na calçada é mais prejudicial do que deixar só a sujeira, pois o saquinho vai para os bueiros e pode entupir as tubulações”, alerta Nilo.

Para testar o recipiente, e melhorar a situação de nossa calçada, instalamos uma dessas lixeiras no portão de nossa redação. Meia hora após a colocação, já havia muitos saquinhos, comprovando a eficiência dessa iniciativa e a necessidade de mais locais para que a vizinhança descarte as sujeiras de seus cães.

Mas atenção! Segundo a subprefeitura, a colocação de lixeiras, grandes ou pequenas, no meio do passeio é irregular. Caso o condomínio ou comércio seja denunciado, poderá pagar multa e ter o recipiente retirado do local. Foi o que aconteceu no Bar Genuíno: “Achamos que não adiantaria nada investir no nosso negócio com uma calçada suja e malcheirosa. Colocamos, então, uma lixeira em frente ao bar e por um tempo conseguimos sanar o problema. Mas, no final de julho, fiscais da subprefeitura, alegando irregularidade, retiraram não só a lixeira, mas também o banco que mantínhamos na calçada devido à Lei Antifumo. Jogaram tudo em cima do caminhão e foram embora. Resultado? Minha calçada voltou a ficar imunda”, indigna-se Valter Sanches, um dos proprietários da choperia. A subprefeitura avisa que somente é permitido fixar lixeiras na grade ou no muro do próprio imóvel, para não prejudicar o trânsito do pedestre.

A discussão é muita, mas não alivia o desconforto de quem anda pelas ruas. Propomos, então: participe da campanha “Calçadas limpas: uma questão de higiene, saúde pública e cidadania”.Basta adquirir a lixeira, a preço de custo e com entrega e instalação gratuitas para a vizinhança, pelo telefone 5571-2738 ou ir na rua Joaquim Távora, 1534, e pedir a lixeira, dizendo que leu o Pedaço da Vila.