A vida de um Mestre

Liu Pai Lin nasceu em Tientsin (ou Tianjin), na China, onde aprendeu com seu tio avô – médico renomado e mestre em artes marciais -, os segredos taoistas. A partir dos 14 anos começou a aprimorá-los com os grandes mestres taoistas Lu Man (Porta do Dragão), Gin San (Montanha Dourada) e Kun Lun (Montanha da China). Aos 17 anos, iniciou sua carreira militar em Huang Pu, a escola militar mais importante da China, sendo responsável pela formação dos mais destacados generais chineses do século passado.

Aos 34 anos, tornou-se General, comandando 60.000 homens em diversas batalhas, quando sofreu sérias lesões que o obrigaram a andar com o auxílio de muletas. Voltou-se, então, aos seus conhecimentos e com a prática e disciplina do Tai Chi Chuan, andou novamente. Em 1975, com 68 anos, o mestre Pai Lin chegou ao Brasil a passeio e aqui em São Paulo decidiu viver, praticar e difundir sua arte marcial. “Ele adorava o Brasil, dizia sempre que era uma nação privilegiada”, revela Geny Chen, sua segunda mulher com quem se casou em 1983.

O Tai Chi Chuan, que quer dizer “Energia Infinita, Arte da Longa Vida, Arte da Energia nos Punhos, Meditação no Movimento”, até então, era pouco conhecido pelos brasileiros. Para praticar e ensinar escolheu o Parque Ibirapuera. Também dava aulas na Missão Católica Chinesa e, em poucos anos, teve seu trabalho reconhecido. Graças ao espírito empreendera de sua esposa, Pai Lin fundou o Instituto Liu Pai Lin de Cultura e Ciência Oriental que, na Vila Mariana, estabeleceu-se inicialmente à Rua Padre Machado, mudando-se posteriormente para a rua Madre Cabrini, 55, onde permanece até hoje.

Lá formou um grande número de professores, massagistas e atendeu a milhares de pessoas. Em 1989 naturalizou-se brasileiro e, em 1993, juntamente com Jerusha Chang organizou a Associação Tai Chi Pai Lin, da qual foi seu presidente vitalício. Durante toda sua vida ministrou cursos de Medicina Tradicional Chinesa (Taoista), Artes Marciais e Treinamento de Energia, produzindo, ensinando e sendo um verdadeiro mestre de muitas escolas, inspirando, com seu exemplo, discípulos que hoje dão continuidade a seus ensinamentos. Mestre Liu Pai Lin iniciava suas atividades às 3h30 da manhã e as encerrava às 19h30, sempre sereno e sorridente. ”Ele vivia para servir”, conta o discípulo Sílvio Bragança, professor do instituto. “Nunca vi meu avô bravo, triste ou irritado. Ele não se importava com o lado material, estava sempre calmo, sereno e sorridente”, lembra a neta Mariana.

Pai Lin dizia que a idade lhe trouxe uma confiança maior nos seus princípios. Para ele, que tinha todos os dentes na boca e nenhuma cárie e que só precisou de óculos para ler aos 80 anos, o segredo de uma vida longa reside no cultivo da serenidade, da calma e na pratica do amor: “Quando você fica nervoso, desequilibra-se e perde uma parte de sua energia para o meio em que está vivendo. Para recuperar e manter a energia o melhor meio é a prática do Tai Chi. Eu me alimento da própria natureza, não só ingerindo alimentos de todas as cores, mas entrando em comunhão com ela”. O mestre ensinava que a única coisa que nos pertence é o nosso próprio corpo e é ele que devemos respeitar: “A melhor forma de fazer isso é amando as outras pessoas.”, afirmava.

O nome Pai Lin que quer dizer “cem anos” (escolhido por ele) e expressa seu sentimento de que todas as pessoas podem ter uma vida longa e saudável: “Pai Lin não é só o meu próprio nome, mas o de todos que se dediquem de coração a essas práticas”. A Medicina Oriental enxerga o corpo humano como se fosse um pequeno universo, onde a cabeça é o céu e o baixo ventre, o interior da terra e, entre o céu e a terra,  todas as coisas florescem. “ O Tai Chi Chuan e a auto-massagem permitem que aprendamos a caminhar pela paisagem, exercitando e aprimorando nossos conhecimentos sobre as leis naturais que nos regem, para que possamos interferir e adequar seu funcionamento”, explica o discípulo prof. Sílvio.

“O Tui Ná, que é a massagem terapêutica chinesa, faz com que caminhemos no pequeno universo do outro, atuando como agente regulador dessa paisagem, assim como a Acupuntura, que faz esse mesmo trabalho de forma muito mais específica e precisa.” Na formação do terapeuta em Medicina Tradicional Chinesa, é necessário  percorrer esses caminhos para o aprimoramento profissional. Para exemplificar: o exercício seria o lavrador que cuida do preparo e plantio de sua terra, o Tui Ná o agricultor que colhe o que plantou em sua terra podendo cuidar do terreno alheio (aquele que cuida bem de sua terra pode cuidar do terreno do outro) e a Acupuntura o jardineiro dedicado que cuida das orquídeas do jardim. Pai Lin foi o jardineiro de um imenso jardim. Suas sementes, inicialmente plantadas no Parque Ibirapuera, germinaram e floresceram pelo mundo. Hoje, falar de Tai Chi Chaun é falar do Mestre Liu Pai Lin, que faleceu a 3 de fevereiro de 2000, quando foi encontrado por seus familiares em posição de meditação.