A arte de envelhecer

A Vila Mariana ocupa o quarto lugar entre os bairros da cidade que abrigam o maior número de idosos. Para atender essa demanda, a região dispõe de diferentes alternativas de hospedagens destinadas à terceira idade. Conhecemos algumas delas e falamos com seus hóspedes e familiares para esclarecer alguns pontos que devem ser levados em consideração para tomar a decisão entre viver sozinho ou mudar-se para uma casa de repouso

Pouco antes das 10h de uma manhã de quinta-feira, Mercedes Sanches, 91 anos, já está preparada para mais um dia de trabalho. É com um sorriso no rosto e muita disposição que a argentina deixa a casa de repouso Vila Mariana, na Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, e segue até a Paróquia Santíssimo Sacramento, na Rua Tutoia, onde trabalha há três anos no bazar beneficente.

Há um ano, Mercedes se despediu da casa da filha, numa travessa da Rua Abílio Soares, e passou a residir na casa de repouso do bairro. “Sempre fui muito independente, e aqui, além de receber todos os cuidados de que preciso, também posso sair para trabalhar de terça à quinta-feira no bazar e conversar com outras pessoas”, revela Mercedes, que ainda dá aulas de artesanato para estudantes de arquitetura do bairro.

Casos de idosos cada vez mais ativos, como Mercedes, estão aumentando ano a ano. Em uma pesquisa realizada pelo IBGE, publicada em agosto de 2013, estima-se que o número de brasileiros acima de 65 anos no país quadruplicará até 2060. De acordo com o levantamento, a população idosa passará de 14,9 milhões, em 2013, para 58,4 milhões, em 2060, e a expectativa de vida saltará de 75 para 81 anos.

E, segundo um censo realizado pelo IBGE, a Vila Mariana ocupava, em 2010, o quarto lugar entre os bairros da capital que mais idosos abrigam: 26.539, ficando atrás apenas dos bairros Jabaquara, Sapopemba e Sacomã.

Para dar conta dessa demanda e melhorar a qualidade de vida na terceira idade, inúmeros projetos foram criados, entre eles o Bairro Amigo do Idoso, que foi inicialmente implantado de maneira piloto na Vila com a Lei 14.905, de 6 de fevereiro de 2009, de autoria do então vereador Gilberto Natalini.

O principal objetivo do Bairro Amigo do Idoso é desenvolver programas de assistência às pessoas da terceira idade que vivem na região e promover mudanças urbanísticas para melhorar a segurança, como a instalação de rampas nas principais vias e a revitalização de praças, transformando-as em espaços de convivência e implantando equipamentos para a prática de atividades físicas.

Casas de repouso

Ao encontro dessa parcela da população, as casas de repouso do bairro se reinventam e apostam em programações culturais e atividades diversas para tornar a hospedagem mais humanizada. Para receber os idosos, a maior parte deles antigos moradores do bairro, elas oferecem diferentes alternativas de hospedagem, temporárias e permanentes, e até exclusiva para mulheres, como é o caso da Nossa Casa.

Contudo, a delicada decisão de encaminhar um familiar para uma dessas instituições esbarra em inúmeros fatores que devem ser levados em consideração. A gerontóloga da Unifesp, Dr.ª Cleofa Toniolo Zenatti, explica que, antes de tudo, é preciso saber a posição do idoso, se ele é independente ou está dependente. “No caso de independentes, a instituição precisa oferecer atividades que os façam se sentir em sua própria casa. Então, eles podem escolher se querem ir ou não. Na maioria das vezes, eles vão porque percebem que, em casa, não conseguem mais se cuidar como antes. Já no caso dos dependentes, quem faz a escolha são os familiares, que têm dificuldades para cuidar”, explica.

Na hora da escolha, D.a Cleofa alerta: “É preciso conhecer a instituição para conhecer sua estrutura: se oferece alimentação e tem acompanhamento nutricional; se tem um corpo de enfermagem e médico permanente, ou que faça visitas com frequência. È preciso ficar atento às adequações de segurança, à equipe que forma essa casa de repouso, e se ela tem atividades de lazer. Depois, ver se está de acordo com as necessidades do idoso”. Para a gerontóloga, é preciso entender que o idoso necessita conviver com pessoas de outras idades. “Precisamos desenvolver estruturas para abrigar os idosos para que possam se relacionar com pessoas mais jovens, isso é importante para eles”, destaca.

De acordo com o diretor da Casa da Vila Mariana, Cássio Salama, muitas famílias buscam esse tipo de hospedagem por não darem conta das tarefas que são exigidas ao cuidar de um idoso, especialmente se ele for dependente. “Cuidar de um idoso dependente em casa é algo muito difícil, pois é preciso estar muito bem preparado para os esforços físicos e emocionais que essa relação exige”, diz.

Muitos idosos acabam tomando a decisão de se hospedar em uma casa de repouso por contra própria, já que as rotinas dos familiares não se encaixam. Foi o que fez a vizinha Dona Nilde Zirpoli, 83 anos. “Eu escolhi morar numa casa de repouso porque já não tinha mais segurança para fazer as minhas tarefas do dia a dia, como ir ao supermercado, por exemplo. Também porque queria sossego e não dar trabalho para a minha família”, relata Nilde, que há um ano reside na Casa da Vila Mariana.

Por outro lado, há pessoas que preferem morar em suas próprias casas, e a maior preocupação é a de sofrer uma queda e não ter a quem recorrer de imediato, como o foi o caso da vizinha Dona Lina Staratan, 84 anos. “Eu desmaiei na cozinha da minha casa, há seis meses, e passei apuros até ser socorrida. Com dificuldades, eu consegui ligar para o meu filho e para a portaria, mas, como a chave estava na porta, foi preciso chamar o resgate. Além de fraturar a cervical, até hoje tem alguns movimentos que ainda não consigo fazer”, diz.

Dona Lina garante que sempre tomou cuidados dentro de casa para evitar algo assim, retirando os tapetes e seguindo os conselhos de segurança enquanto está no banheiro. Após o tombo, ela resolveu se mudar de casa e contratar três cuidadoras para acompanhá-la. “Tenho medo de ficar sozinha e desmaiar novamente. As cuidadoras me fazem sentir mais segurança para passear pelo bairro”, diz Lina, que, por ser uma fumante convicta, preferiu continuar em sua própria casa, na Rua Maestro Callia.

Segundo o tenente do Corpo de Bombeiros, Augusto Nacano, quedas como a sofrida por Lina são ocorrências frequentes na Companhia. “É muito comum, especialmente com os idosos, quedas ao tropeçar na rua ou na própria residência, e sermos acionados para socorrê-los. Isso acontece diariamente!”, diz Nacano.

A flexibilidade das instituições de repouso, que também oferecem hospedagens temporárias, acaba atraindo idosos que sofreram alguma lesão e ainda não estão preparados para voltar para casa, como explica Salama: “Às vezes, um idoso está bem para continuar no hospital, mas não o suficiente para ir para sua casa; então, a casa de repouso acaba sendo algo intermediário; muitos se hospedam aqui para se recuperar de alguma lesão e depois retornam para sua casa”.

Hospedar um familiar numa casa de repouso do bairro, próximo da família, é muito bom, diz Roseli Lara Campos, 82 anos, que há um ano, todos os dias, visita o marido, Luizito Conrado, 83 anos. “Estamos casados há 61 anos. Eu sinto muita falta dele em casa, mas com a implantação dessas novas leis trabalhistas ficou inviável manter cuidadoras e enfermeiras dentro de casa”, declara.

Quando ficar dependente das demais pessoas para fazer suas tarefas, Roseli não dispensa a possibilidade de também ficar em uma casa de repouso, mas reconhece: “Essa é uma decisão muito delicada; é preciso analisar os prós e os contras; logicamente, nada se compara à nossa casa”, defende.

A possibilidade de sair para trabalhar e conversar com outras pessoas fora da casa de repouso, diz Mercedes, é muito boa. “No bazar eu posso fazer mais amigos. Eu sempre fui muito comunicativa”, diz, e completa: “Temos que compartilhar as nossas alegrias, pois elas são para serem transmitidas”.

Chegar à terceira idade com disposição, segurança e saúde é o que todos desejam; afinal é o caminho natural da vida. Com o aumento da população idosa, é inevitável criar formas alternativas para administrar plena-mente essa fase da vida com arte, cultura, atividades físicas e amigos! Quem disse que a alma envelhece?

Conheça os serviços que a Vila Mariana oferece para seus idosos

Há vários serviços de hospedagem para  os idosos na Vila Mariana, com infraestrutura adequada e atividades físicas e culturais; além de uma programação diversificada para tornar a terceira idade mais feliz e produtiva

RESIDENCIAIS

Casa Pró-idoso

Voltada à saúde, conta com quartos individuais ou duplos e acompanhamento médico 24 horas

Rua Morgado de Mateus, 601. Tel.: 5573-3111

Casa da Vila Mariana

Com cinco unidades no bairro, congrega idosos dependentes e independentes, oferecendo hospedagens temporárias e permanente e o atendi-mento inclui atividades culturais e passeios

Matriz: Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 367. Tel.: 5579.1514

Lar Santa Cecília

Hospedes semidependentes, serviços de enfer-magem 24h, fisioterapeuta, atividades culturais aos finais de semana, como dança do ventre e canto. Rua Machado de Assis, 194. Tel.: 5579-9766

Mental Sênior

Voltado ao atendimento da população idosa com comprometimentos clínicos ou psiquiátricos

Rua Joaquim Távora, 1555. Tel.: 5573-7358

Nossa Casa

Exclusiva para mulheres, oferece atividades como arte terapia, aula de inglês e dança terapia

Rua Ouvidor Peleja, 126. Tel.: 2275-2516

Residencial Israelita Albert Einstein

Direcionado à saúde, com atividades que incluem musicoterapia, arte terapia e sessões de cinema.

Rua Coronel Lisboa, 139. Tel.: 2151-7200

Residencial Vale do Sol

Voltada ao atendimento de idosos independentes e dependentes, a casa oferece oficinas de dança duas vezes na semana.

Rua Cubatão, 1049. Telefone: 5579-4241

ONDE ESTUDAR 

Universidade Aberta à Terceira Idade (Unifesp)

Oferece duas aulas semanais, durante oito meses. O curso gratuito inclui aulas sobre literatura, direito e saúde.

Rua Prof. Francisco de Castro. 75 Tel.: 5080-3588

Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação (FAPCOM)

Oferece curso de extensão em Comunicação e Informática para a Melhor Idade com uma grade que contempla Introdução à RP, Coral, Informática, Espanhol, entre outras.

Rua Major Maragliano, 191. Tel.: 0800 709 8707

SESC VILA MARIANA 

São muitas as atividades para pessoas com mais de 60 anos no Sesc VM: atividades físicas, cursos de arte, artesanato, informática, radionovela… No dia 24 de julho, a Gerontóloga, formada pela Universidade de São Paulo, doutoranda em Neurologia pela Faculdade de Medicina da USP, Drª Thais Bento Lima da Silva, orientará sobre atitudes e hábitos que estimulem o cérebro e contribuem para prolongar a auto-nomia e a comunicação. A programação do mês está disponível na unidade ou pelo site www.sescsp.org.br . Rua Pelotas,  141.