Qual o gosto da arte?
Recebi um e-mail de um leitor curioso, querendo saber por que eu troquei a arquitetura pela gastronomia e, segundo ele, num trocadilho, substituí o gosto pela arte pela arte culinária.
Quero esclarecer que não troquei: continuo atuando como arquiteto. Apenas acrescentei às minhas atividades a atribuição de chefe de cozinha.
Aproveitando o gancho, gostaria de falar um pouco sobre a arte. Não vou cair na ingenuidade de tentar definir o que ela é. Tantos já o fizeram e, a meu ver, ninguém até hoje conseguiu. Vou falar da armadilha em que muitos caem diante de uma expressão artística, e de tentar achar nela o belo.
Deveríamos confiar mais, no prazer da experiência, na descoberta, na inquietação ou no incômodo, do que na primeira impressão estética que causa nos nossos sentidos óbvios.
A maioria de nós tem dificuldade em decretar a qualidade de uma produção artística. Dizemos “Eu gosto”, destacando o “eu” para limitar o alcance de nossa aprovação, ou “Eu gostei”, mostrando que nossa experiência foi pontual, sem consequências que façam o homem espiritual se erguer e o carnal cair de joelhos.
Quanto mais materiais somos, menos arte percebemos. É mais ou menos assim: como quando tentamos julgar o outro. Ora, não há como julgar os outros sem aceitar que eles são meus semelhantes e sem, de alguma forma, identificar-me com eles por um instante.
Para julgar preciso entender, e para entender preciso me conhecer o suficiente para encontrar em mim mesmo todos (ou quase) os traços da diversidade humana.
É reconhecendo em mim mesmo desejos de matar, roubar, fornicar etc, que desenvolvo a estatura estética de avaliar as condutas, a arte, de quem eventualmente reprime esses mesmos desejos menos do que eu.
Quem apenas observa arte e não se deixa incomodar por ela é como o moralista imoral que julga o próximo segundo seus próprios desejos reprimidos, não segundo a excelência artística e moral de Deus.
Quanto à “arte culinária”, não sei se o trocadilho é correto, só sei que não é o domínio da técnica, antes a capacidade que alguns têm de misturar elementos improváveis, com resultados que despertam em nós emoções variadas de prazer ou, quem sabe, asco.
INGREDIENTES:
1 kg de jiló
1 kg de açúcar cristal
1 colher de café de ácido cítrico
10 folhas de figo
500 ml de água
PREPARO:
Retire os cabos do jiló e cozinhe-o com todos os outros ingredientes por 30 min. Deixe esfriar e descansar por um dia e repita a operação mais duas vezes. Bom apetite, ou não! “Eu gostei.”
Felipe Ciutat é chef de cozinha do Restaurante O Vegetariano:
Av. Jabaquara, 1126. Tel: 5587-3785