À moda da mandioca

Recordo-me de como fiquei encantada quando ouvi pela primeira vez, na escola, a lenda da mandioca. Ela conta de uma forma folclórica a origem dessa raiz que é um dos principais alimentos dos povos indígenas brasileiros.

De acordo com a lenda, Mani era uma menina, com pele bem branca. Um dia Mani ficou doente e morreu. Seu corpo foi enterrado dentro da própria oca seguindo a tradição e o costume cultural do povo indígena Tupi. Os pais regaram o local onde a menina tinha sido enterrada com água e muitas lágrimas. Depois de alguns dias nasceu dentro da oca uma planta cuja raiz era marrom por fora e bem branquinha por dentro. Em homenagem a filha, ganhou o nome de Maniva.

Os índios passaram a usar a raiz da nova planta para fazer farinha e uma bebida (cauim). Ela ganhou o nome de mandioca: uma junção de Mani (nome da indiazinha morta) e oca (habitação indígena).

Mandioca, inhame, aipim, macaxeira, castelinha, mandioca-mansa… muitos são os nomes da mesma raiz, variações regionais deste país imenso que é o nosso Brasil! Eleita pela Organização das Nações Unidas, a ONU, como o alimento do século 21 e reverenciada no Brasil há muito tempo, a mandioca existe há cerca de 7 mil anos, sendo cultivada na Amazônia. 

Devemos aos indígenas toda a nossa cultura da mandioca, foram eles que a plantaram, cultivaram, descascaram, ralaram, espremeram, escorrendo seu suco venenoso e aprenderam a extraí-lo. Desse liquido temos uma goma que pode ser utilizada em bebidas fermentadas ou em subprodutos como a tapioca (feita a partir do amido da mandioca, ou goma de mandioca). 

A Mandioca era o alimento dos deuses para os povos indígenas e também passou a ser fonte de energia para muitos dos europeus, que, desse lado do Atlântico, trocaram o pão de trigo pelo beiju (preparado a partir da massa da mandioca, ralada e peneirada, rica em celulose, material com que se faz a farinha de mandioca).

Em 1638, durante o governo holandês no Nordeste, o príncipe Mauricio de Nassau exigia, através de decretos, o cultivo da macaxeira a todos os agricultores, e ainda defendia as qualidades da planta!

Versátil, a mandioca é soberana na culinária brasileira. Entre seus derivados, a farinha reina na cozinha sertaneja e acompanha desde o feijão à carne-seca. Já o tacacá, antes servido apenas na Região Norte — em que a goma e o tucupi dão o caldo — hoje é apreciado também em restaurantes ao Sul do país. 

A tapioca é a filha mais famosa da mandioca! Está na moda, com recheios salgados ou doces — para o bem e para o mal, com os ingredientes originais, como o peixe, coco ralado e o queijo coalho. E, na minha opinião, para o mal, com a moda do leite condensado, brigadeiros e afins. No reino da confeitaria, os doces feitos com os filhos da mandioca, que eu amo, são: sequilho de coco, brevidade de polvilho, pudim de tapioca e o sagu com vinho tinto! 

Sagu com vinho tinto

Ingredientes para o sagu: Rende de 10 a 12 taças.

2 xícaras de chá de vinho cabernet sauvignon; 2 xícaras de chá de água; 100 g de sagu de tapioca; ¾ xícaras de chá de açúcar; 1 pau de canela pequeno; 1 cravo-da-índia

Ingredientes para o creme inglês: 250 ml de leite; 1 fava de baunilha com um corte não profundo no sentido do comprimento; 250 ml de creme de leite fresco; 6 gemas; 1/2 xícaras de chá de açúcar.

Modo de preparo do sagu: Numa tigela, coloque o vinho e a água, mexa, e depois acrescente o sagu, deixando de molho por uma hora. Transfira a mistura para uma panela, junte o açúcar, a canela e o cravo e leve ao fogo baixo, mexendo de vez em quando, até ficar translúcido e cozido (levará cerca de 20 minutos). Deixe amornar e distribua em taças. Quando esfriar, cubra com filme plástico e leve à geladeira. 

Modo de preparo do creme inglês: Coloque o leite, a baunilha e o creme de leite fresco numa panela e leve ao fogo baixo até quase ferver. Descarte, então, a fava de baunilha. Bata as gemas com o açúcar com um batedor de arame. Junte metade do leite às gemas, batendo sem parar, e depois misture com a outra metade do leite. Leve ao fogo baixo e mexa sem parar com uma colher de pau até engros-sar (sem ferver). Deixe esfriar e leve à geladeira. Na hora de servir, cubra as taças com o creme.

Maria Helena Serrano é chefe de confeitaria desde 1994,  frequentou a École Lenôtre em Paris  e é proprietária da Quinto Pecado Café Bistrô: Rua Cel. Artur de Godoi, 12. 

www.quintopecadodoces.com.br mariahelena@qpecado.com