Explorando o interior da França

Em setembro do ano passado, fui com meu marido para a França. Pegamos o voo da Singapore Airlines, que faz escala em Barcelona, e de lá seguimos para Andorra e o sudoeste francês, passando pela Touraine e pela Aquitânia, e depois indo para Bordeaux, para o Vale do Loire e, enfim, para Paris.

De todas essas regiões que visitamos, as que mais nos agradaram foram Quercy e Périgord, no caminho entre Toulouse e Bordeaux. Relativamente desconhecidas pelos turistas estrangeiros, essas regiões possuem paisagens magníficas, formadas por um conjunto de florestas, rios e rochedos. Não existe nenhuma metrópole por perto, apenas algumas cidades pequenas e muitas vilas, várias delas bem pitorescas. 

O grande barato é que há várias ligações entre elas por meio de incontáveis estradinhas, de forma que é possível viajar por meio de diversos caminhos diferentes. 

Saindo de Toulouse, dirigimo-nos para Albi, cidade do pintor Toulouse-Lautrec, muito famosa por seus imensos prédios de tijolos e pelo museu do artista. E, de Albi, pegamos uma estradinha em direção a Montauban, que atravessa a Floresta de Grésigne e passa por cidadezinhas lindas, perdidas no tempo, em especial a cidade fortificada de Cordes, uma das cidades-bastides (cidades planejadas que foram construídas no século XIII por ingleses e franceses para estimular a povoação de áreas vazias antes da Guerra dos Cem Anos).

Cordes é também chamada de Cordes-sur-Ciel, pois, como se localiza no cume de uma montanha, em determinadas condições atmosféricas (muita neblina) parece suspensa no céu. Mesmo sem neblina, o visual já é incrível. Não foi à toa que Albert Camus, ao visitar suas ruelas íngremes, escreveu: “tudo aqui é bonito, mesmo a tristeza”.

Prosseguimos a viagem e passamos por Penne e seu castelo em ruínas, bem como por Bruniquel e seu castelo ainda conservado. Mais tarde, passamos por Montauban, mas não nos interessamos muito em parar e, enfim, chegamos a Cahors, onde passamos a noite.0Cahors é a capital do departamento do Lot e ponto de partida para a exploração das vilas (como Figeac, local de nascimento de Jean-François Champollion) e sítios arqueológicos pré-históricos que existem às margens dos rios Lot e Célé. 

Na cidade, há um centro histórico medieval muito interessante e um dos monumentos mais fotografados da França, a Pont Valentré, uma ponte fortificada construída no século XIV. Como a visitamos à noite, a pouca iluminação nos dava a sensação de ter voltado no tempo.

Na manhã seguinte, fomos logo cedo para Rocamadour… Tá certo que ainda faltam muitos outros lugares na França para eu visitar, e talvez seja prematuro opinar, mas mesmo assim vou arriscar: Rocamadour é a cidade mais bonita da França. Desde que vi a foto dela no guia da DK, fiquei enlouquecida para conhecê-la e fiz de tudo para incluí-la em nosso roteiro, mesmo sendo um pouquinho fora de mão.0Isso porque, para chegar à cidade, é preciso pegar uma estradinha bem sinuosa, ladeada por penhascos. Mas o esforço foi recompensado pela sensacional vista de Rocamadour do outro lado da montanha.

Rocamadour tornou-se um dos mais importantes centros de peregrinação depois da descoberta, em 1166, de um antigo túmulo e sepulcro com um corpo ainda conservado de um eremita do início do cristianismo conhecido como “roc amator” (amante das rochas), mais tarde batizado como Santo Amador. Daí o nome da cidade, que reúne várias capelas, um castelo e as Estações da Cruz, 14 estações que reproduzem a via-crúcis na escalada pela colina até o castelo.

Percebemos que na cidade há diversas opções interessantes de hospedagem, inclusive um Best Western. Na verdade, teria valido muito mais a pena ter dormido em Rocamadour do que em Cahors, mesmo porque parece que a cidade fica mais bonita ainda logo cedo, quando os primeiros raios de sol iluminam de laranja toda a sua fachada. Com imenso pesar, partimos de Rocamadour em direção ao Périgord. 

Resolvemos parar perto de Carsac, para almoçar à beira da estrada em uma creperia super simpática, com um imenso jardim na frente. Somente famílias francesas, com seus filhos — por sinal, lindos e educados —, estavam lá. Uma refeição perfeita ao ar livre, um exemplo mais do que apropriado do que se entende por slow food e slow travel. Voltando à realidade, pegamos o carro novamente e fomos até La Roque-Gageac. Se Rocamadour foi a cidade mais bonita que conhecemos nessa viagem à França, La Roque-Gageac foi, seguramente, a segunda mais bonita. Trata-se na realidade de uma vilinha, encravada na pequena faixa de terra existente entre o rochedo e o Rio Dordogne.

Quando chegamos, estava para sair o barco, réplica de uma gabarre (tipo de barco que era usado no passado), que faz um passeio de mais ou menos uma hora pelo Rio Dordogne.0O barco passa por pontos importantes da região, como o Château de Castelnaud, castelo que abriga o Museu da Guerra Medieval. Depois desse passeio, pegamos a estrada novamente, em direção a Sarlat-la-Canéda. A cidade possui a maior concentração de fachadas medievais, renascentistas e do século XVII entre as cidades da França. Super agradável, com várias opções de restaurante e de hospedagem. Para quem quiser visitá-la, a dica é ir às quartas-feiras e aos sábados, por causa do mercado que é montado a céu aberto. Imperdível para quem gosta de foie gras, nozes, trufas negras e cogumelos selvagens.

A próxima etapa foi a cidadezinha de Les Eyzies de Tayac, onde estão localizados o Museu de Pré-História e uma caverna com pinturas rupestres. Lá nos hospedamos no Les Glycines, um hotelzinho super charmoso e acolhedor que integra a Château & Hotels Collection, e jantamos maravilhosamente bem na Hostellerie du Passeur.

Na manhã seguinte, já restabelecidos da esbórnia da noite anterior, visitamos a caverna Font-de-Gaume, que contém 250 pinturas policromáticas e gravuras que se acredita terem por volta de 16 mil anos, e o Musée National de

Préhistoire, um museu moderno, encravado na rocha, que guarda a coleção de achados arqueológicos do Vale do Vézère, outro rio que corta a região e que passa por Les Eyzies. Voltamos para o hotel, fizemos o check-out e pegamos o caminho para a famosa caverna de Lascaux, próxima à vila de Montignac. 

Também conhecida como a Capela Sistina da Arte Rupestre, a caverna, descoberta em 12/09/1940 por quatro adolescentes que estavam passeando pela região com o seu cachorro, possui talvez as mais famosas pinturas paleolíticas de todo o mundo. Como ela foi fechada em 1963, para impedir a deterioração das pinturas, uma réplica fiel delas foi feita em uma outra caverna próxima, Lascaux II, e é essa caverna que se pode visitar. Mesmo sendo uma cópia, vale muito a pena. As pinturas são muito sofisticadas e demonstram até mesmo noções de perspectiva e de volume.

Saindo de Lascaux, partimos para a Gironde, região de Bordeaux. Também gostamos muito de lá (mais detalhes no meu blog: bulletenacidade.blogspot.com), mas nos arrependemos imensamente de não ter programado ficar mais tempo nessas duas regiões, Quercy e Périgord, que ainda têm muito a oferecer.

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