Vila Mariana amo você

Aquele apito ecoando na madrugada e o som das correntes da bicicleta rodando, a cada hora, denunciavam que o “guarda noturno” estava pela rua fazendo sua ronda como de costume. Era a garantia de que você podia dormir tranquilo e com segurança.

A Vila Mariana sempre teve e ainda tem muitos guardas noturnos que tomam conta das ruas calmas da nossa Vila. São pessoas conhecidas dos moradores e que, por anos, cuidam da segurança da mesma rua e das mesmas famílias. Tornam-se amigos — e às vezes até compadres — dos moradores, de tanta afinidade!

Eu e o Levy, na nossa juventude, conhecemos muitos guardas noturnos, pois sempre andávamos muito pelas madrugadas da Vila Mariana, tocando nos clubes e casas de amigos ou apenas zoando com a nossa turma. 

Quando éramos bem garotos, meu pai não me deixava chegar de madrugada em casa, tinha que retornar às 11 horas da noite. Então, eu e o Levy sempre combinávamos uma estratégia para burlar essa lei paterna. 

A estratégia era simples: antes de sair de casa, eu deixava a janela do primeiro andar aberta para, quando chegássemos de madrugada, eu entrar por ela sem meu pai ver. Mas, havia um problema: a janela era alta e precisávamos de apoio para subir. E quem ajudava? 

Pradinho, o guarda noturno. Kkkkkkkkkk. O Pradinho era um “santo”. Eu subia nas suas costas, no seu ombro e de pé alcançava a janela. Era moleza. O Pradinho era forte e não ligava. Ele dava uma força, sempre. 

Só que um dia o meu pai percebeu e fechou a janela por dentro. Desgraça pouca é bobagem! Subi no ombro do Pradinho e quando fui abrir a janela que meu pai tinha fechado, fiz muita força e “catapluft”… todo mundo pro chão… eu, Pradinho e o Levy. 

Um barulhão na madrugada. Gritos, risadas e latidos de cachorro. Meu pai, que já estava de “butuca”, abriu a janela e foi o maior escândalo que a madrugada da Rua Áurea já ouviu na sua vida. Kkkkkkkkk

Os guardas noturnos ficavam anos nas suas funções e conheciam todas as crianças,  jovens e adultos das ruas. Lembro bem do Isaac, um paraibano “animal”, forte como um touro, que andava armado e parecia um “xerife”. Havia o Delén, que tinha esse apelido porque bebia tanto que ia badalando pelas calçadas como um sino fazendo “delém, delém, delém. Kkkkkkkkkk. Tinha o Arquimedes, que chegou a colocar uma estrela no peito e andava de botas como um cowboy. 

Eles eram tão gente boa que vários deles foram ajudados pelos moradores — com bolsas de estudo ou mesmo pequenos investimentos — e, assim, puderam estudar e se tornar advogados, contadores e ter seu pequeno comércio. Sou amigo do “Guarda Noturno Pradinho” até hoje e padrinho dos seus filhos. Figuras lendárias da Vila Mariana de um tempo que não volta mais.

As madrugadas eram seguras e os vilamarianenses podiam dormir tranquilos porque contavam com um “anjo das ruas”. Eu e o Levy sempre tivemos esses “anjos” como amigos e essa linda lembrança que nunca será apagada de nossas mentes.