THOBIAS FURTADO

Mestre em Políticas Ambientais e Ciência da Sustentabilidade, é o fundador da ONG Parque Ibirapuera Conservação, que atua, inicialmente,  pela manutenção do local e conscientização de seus frequentadores. Nesta entrevista ao Pedaço da Vila, ele fala sobre o trabalho desenvolvido pela ONG, revela suas experiências em outros parques do mundo, conta sobre os desafios para gerir um parque dessa dimensão e destaca propostas para torná-lo cada vez melhor

Pedaço da Vila: Quando surgiu seu interesse pelos parques?

Thobias Furtado: Meu interesse se materializou na adolescência, quando morei em uma fazenda orgânica, na Nova Zelândia, e tive a oportunidade de ser guiado em inúmeras longas caminhadas em parques por Mr. Morton, um experiente conservacionista de Bay of Plenty. Fiquei encantando com a organização de trilhas e alojamentos e descobri caminhadas fantásticas em parques nacionais. Depois, me interessei por gestão e desenvolvimento de infraestrutura, estudei engenharia civil e, com uma bolsa, fui completar os estudos em gestão de recursos naturais e meio ambiente, na Alemanha. Trabalhei na Vale do Rio Doce, mas saí para fazer um mestrado em políticas ambientais e ciências da sustentabilidade. Foquei na sustentabilidade financeira e ambiental de modelos de parcerias público-privadas, estruturação de financiamento e operação de ativos, trabalhando em Estocolmo com investimentos em infraestrutura em quatro continentes do mundo. Há alguns anos, vim morar perto do Parque Ibirapuera, em São Paulo, me aproximando mais de finanças com imobiliário, carbono e energia. Encontrei no Ibirapuera uma oportunidade de me aproximar do parque e aprender de perto como funcionava sua gestão, para buscar eficiência e contribuir com minhas experiências. 

P.daVila: Desde quando você faz parte do Conselho do Parque Ibirapuera e como pode contribuir com essa experiência?

Thobias Furtado: Fui eleito em 2010, como representante suplente dos usuários, mas logo na segunda reunião me elegeram Secretário do Conselho. A agenda que eu apresentei buscava a melhora contínua na governança para que pudéssemos, de fato, alcançar e tratar com profissionalismo todos os quesitos que, segundo a lei, deveríamos ter na casa. Dentre uma séria de competências, cabe ao conselho fiscalizar, buscar a organização, propor estratégias, participar do plano diretor do parque – que vence este ano-, analisar os eventos e auxiliar a direção a esclarecer as dúvidas dos frequentadores. Porém, esta claro hoje que o Conselho, que é todo voluntário, e por isto se reúne somente duas horas por mês, só alcançará a visão dos legisladores se tiver em mãos um relatório mensal completo, com indicadores, e um resumo mensal vindo da administração sobre o que acontece no parque – um superdesafio para a prefeitura. Depois de muita discussão, conseguimos implementar algo discreto no Ibirapuera, beirando o funcional. Agora é preciso aprimorar muito para que o Conselho possa, de fato, usar da sua riqueza participativa para conquistas de gestão mais sólidas, e não virar uma simples réplica de consulta pública com microfones, opiniões e poucos avanços.

P.daVila: Como é a gestão de outros parques no mundo?

Thobias Furtado: A gestão, essencialmente de pessoas conservando áreas verdes para uso público, apesar de aparentemente similar, diverge bastante. Em resumo, existem inúmeros modelos e possíveis categorizações. O modelo tradicional é cada vez mais contestado, por ser oneroso na criação de novos parques, pois são inteiramente financiados por impostos e geridos pelo governo. Há outro modelo, no qual os parques buscam gerar receita sobre algumas diretrizes para serem mais sustentáveis. Há, também, a gestão parecida com a do Parque Ibirapuera, que é praticamente terceirizada. No Parque Ibirapuera quase todo o orçamento, dezenas de milhões de reais, vai para os contratos de manutenção e mão de obra operacional, para duas empresas privadas com fins lucrativos. Mas o modelo no qual acredito, ideal para o Ibirapuera, vencedor e sustentável, é trazer iniciativas privadas, sem fins lucrativos, para ajudar no cuidado do parque; isso reduziria o pesado encargo dos impostos sobre os que não frequentam o parque. Há ainda uma gestão na qual uma área do parque é concebida e explorada por lucro, em diferentes modelos, que, apesar de ser interessante para áreas de conservação, não cabe ao Ibirapuera. Enfim, isso é uma pincelada das várias gestões, mas cada um dos parques tem peculiaridades e não há uma gestão perfeita, mas uma combinação adequada para a realidade de cada local. O Instituto Semeia e o fórum Arq.Futuro estão promovendo material e encontros muito interessantes para difundir e debater modelos de gestão de unidades de conservação e parques urbanos. Iniciativas como essas contam com nosso total suporte. Mas, no caso do Ibirapuera, acredito que o ponto central para aprimorarmos é facilitar a participação do frequentador no cuidado do parque. Admiro muito os vereadores que criaram, lutaram e aprimoram o modelo de conselho, mas não podemos parar por aí. Difundir a governança e a participação em organizações sem fins lucrativos, de maneira responsável, é neces-sário para ajustarmos o melhor modelo para cada parque.

P.daVila: Quais são os maiores problemas do Parque Ibirapuera?

Thobias Furtado: O parque tem inúmeros desafios. Talvez o principal deles seja prover uma experiência realmente inspiradora para o frequentador e incentivá-lo a cuidar do espaço público. O melhor uso dos espaços, a educação e a operacionalização dos resíduos, o cuidado e a manutenção das áreas verdes e da infraestrutura; tudo isso é pertinente. A questão é onde devemos focar para criar ou agregar ao modelo de gestão particular do Ibirapuera? Só dessa forma poderemos vencer problemas e prover essa experiência ao usuário de forma ágil, pouco onerosa e responsável. 

P.daVila: E como melhorar a gestão do Parque Ibirapuera?

Thobias Furtado: Não está na direção cobrar e cobrar do governo por mais cuidado, está em mobilizar as pessoas a cuidarmos juntos do parque. Os ajustes e a melhoria continuam sendo responsabilidade do setor público, mas acontecem quando o frequentador se mobiliza e se importa, dentro, claro, de sua limitação e interesse. 

P.davila: A ONG Parque Ibirapuera Conservação foi criada para gerar uma maior mobilização?

Thobias Furtado: Acredito na participação legítima dos frequentadores, por meio de uma organização sem fins lucrativos, transparente e participativa. São Paulo e o Parque Ibirapuera merecem isso! Por isso criamos o Parque Ibirapuera Conservação com os amigos do parque. Temos quase mil voluntários cadastrados e centenas deles ativos conosco, melhorando o parque. A comunicação é feita por e-mails, portal e rede social. São milhões de visitantes por ano. Hoje fazemos ações de limpeza e conservação, e nos próximos meses sairão as primeiras obras de restauração e de extensão de atendimento, após uma parceria com a prefeitura. E podemos mais! Os frequentadores querem cuidar da cidade, e não há lugar mais propício para esse envolvimento que os parques urbanos, onde os cidadãos estão juntos buscando o melhor da cidade. A gestão vai melhorar quando mais pessoas, de forma organizada e responsável, puderem contribuir com o cuidado do que gostam. Antes de me candidatar ao Conselho, em 2010, sabia que esse era o caminho, mas nada acontece de um dia para o outro. Não conhecia o funcionamento do parque como conheço hoje, e uma organização forte e legítima como é hoje o Parque Ibirapuera Conservação tem que crescer organicamente, tem que entender as dificuldades e os atores, para que possa prosperar.

P.davila: A página da Conservação no facebook tem mais de 500 mil cliques!

Thobias Furtado: Nosso desafio nas redes sociais é levar o usuário que ama o parque a entender como pode cuidar melhor do espaço. É mostrar o caminho para que ele participe conosco desde movimento, de frequentador para frequentador. A ideia é mostrar aos usuários que as coisas não melhoram enquanto só se aponta o dedo, e convidá-los a nos ajudar a resolver os problemas apontados.

P.daVila: Qual é a maior dificuldade para realizar bons projetos no parque?

Thobias Furtado: A falta de um plano master, que já estamos esboçando. Mas não podemos ter a pretensão de imaginar que essa é uma tarefa da Conservação — um plano desse tem que ser legítimo, público, construído a várias mãos, com detalhes que descrevam os uso do parque, levantando a história e o patrimônio que deve ser conservado, refletindo sobre a transformação e apontando o caminho para os próximos anos. Um plano aprovado em todas as instâncias e por todos — os stakeholders — é a forma para que possamos avançar, metodicamente, pelos desafios históricos de manutenção, limpeza, lago, quadra, mobilidade, conservação de trilhas e bosques, e por aí vai… A prefeitura cuida de mais de 100 parques na cidade; acreditamos que essa tarefa pode ser conduzida junto à sociedade civil.

P.daVila: Essa visão inovadora de gestão se relaciona bem com os órgãos públicos?

Thobias Furtado: Nos últimos meses, a maior dificuldade na prática tem sido o reconhecimento dessa iniciativa participativa pela alta administração, bem como trazer um diálogo inovador na busca pela construção desse plano, que abre espaço para a revitalização de espaços esportivos, playground, trilhas, lago e muito mais. O Plano Diretor do Parque Ibirapuera termina neste ano. Temos aqui dezenas de documentos coletados em parques mundo afora, detalhes de conversas, experiências, lista de contatos, histórico do Ibirapuera, opinião de acadêmicos, estudiosos e profissionais, mas, essencialmente, este é um plano público e deve ser feito junto com a prefeitura.

P.daVila: O que o Parque Ibirapuera Conservação já realizou?

Thobias Furtado: Começamos na busca pela governança e transparência do parque de maneira responsável. Criamos ouvidoria voluntária e levamos informação de qualidade aos usuários sobre o que acontece no parque, pedindo sua opinião e sugestão, a serem enviadas para o Conselho ou a Administração. Depois iniciamos ações periódicas de educação e mobilização ambiental, promovendo mutirões de limpeza e, junto com os parceiros, esboçando um planejamento de resíduos sólidos para o parque. Estivemos em visita a parques americanos e estamos estreitando a colaboração e a troca de experiências em ações contra a sujeira no Ibirapuera. Recém-começamos ações de restauração e pintamos parte do Viveiro Manequinho Lopes — temos material e disposição para muito mais! Podemos arrumar quadras, tirar pichações da serraria, mas para isso precisamos que a divisão de administração do parque abrace nossa colaboração e seja parceira, para avançarmos mais rápido.

P.daVila: Quem são os usuários que fazem parte do projeto?

Thobias Furtado: Temos diversos tipos de voluntários, divididos em dois grupos: os que querem investir uma ou duas horas nos ajudando em ações no parque, e aqueles que podem se comprometer com doações e/ou participação de longo prazo. Todos são bem-vindos. Todos que amam e querem cuidar do parque podem ser membros da Conservação. Para fazer doação e vestir nossa camisa, o usuário pode ir no www.ibira.org. Para se inscrever como voluntário, aproximar-se de uma das nossas ações e, depois, participar de maneira estratégica, sugerimos a inscrição como voluntário no www.parqueibirpauera.org. Nosso objetivo é mobilizar frequentadores que visitam o parque e que podem ajudar financeiramente a Conservação a dar passos mais largos na restauração de trilhas, monumentos históricos, construções, lagos, praças. Buscamos consolidar uma organização legítima, participativa e profissional, com a participação dos vizinhos e amigos do parque para um auxílio responsável da prefeitura e da sociedade no cuidado do parque.

P.daVila: Qual é a próxima ação no parque?

Thobias Furtado: No dia 29 de novembro faremos outro mutirão de limpeza em uma caminhada de 2 horas, em que você pode conhecer outros usuários que participam ativamente no cuidado do parque. Nas próximas semanas fecharemos nosso calendário de ações de voluntariado, basta ficar de olho em nosso portal www.parqueibirapuera.org e nas redes sociais.