Helena Corazza
Fake News, termo em inglês que significa notícias falsas, é um dos assuntos mais debatidos nesta era de comunicação digital. A diretora do Serviço à Pastoral da Comunicação (SEPAC) e professora do Instituto Teológico São Paulo (ITS), a doutora em comunicação e irmã da Congregação Paulinas Helena Corazza, explica, na conversa a seguir, a natureza do fenômeno Fake News e seus impactos, os interesses que o sustentam e destaca o papel do jornalismo nesse momento de desinformação. A vizinha, que também é autora, entre outros, dos livros Educomunicação: formação na cultura digital e A comunicação nas celebrações litúrgicas, ainda ressalta que a informação de qualidade é um direto da população, que precisa se manifestar criticamente para exigi-la da imprensa. Ela também ensina alguns cuidados simples e eficazes para não ser enganado pelas falsas notícias “Antes de compartilhar, procure saber o que está compartilhando. E, se estiver na dúvida, converse com outras pessoas”, orienta.
Pedaço da vila: As Fake News [notícias falsas] ocupam um lugar de destaque nos debates sobre a comunicação em tempos digitais. Como a senhora vê esse fenômeno?
Helena Corazza: Os boatos sempre existiram na história da humanidade e acredito que também na imprensa desde os seus primórdios. Mas talvez não com a intensidade que estamos vendo hoje. Apenas para observar, fake news é uma denominação imprópria, pois é o fato que gera a notícia. Não havendo o fato, não há a notícia. O que presenciamos é que há sensacionalismo com o simples objetivo de atrair audiência e monetarização dos clicks. Creio que o diferencial das chamadas fake news agora é a rapidez com que se espalham pela internet, a capilaridade que alcançam e a sua função mercadológica.
Pedaço da Vila: A que a senhora atribui essa rápida expansão?
Helena Corazza: O ser humano é ávido por novidades, principalmente quando está com a mente desocupada. Essa curiosidade se aguça sobretudo quando a vida privada de alguém é colocada a público. Isso demonstra uma grande inversão de valores e falta de senso crítico diante dos fatos; há uma incapacidade na hora de avaliar as consequências. Hoje, com a internet, houve uma mudança importante: o polo do emissor foi liberado e qualquer pessoa é, potencialmente, produtora e reprodutora de conteúdo.
Pedaço da Vila: Qual é o poder de influência das Fake News sobre a tomada de decisão de uma pessoa?
Helena Corazza: Nos estudos de comunicação, há alguns elementos que são observados nesse processo, entre eles a identificação e a catarse. Há outros mecanismos psicológicos que nos ajudam a compreender o comportamento da pessoa e dos grupos. É muito comum que a pessoa busque a confirmação daquilo que ela já pensa. No entanto, há a desinformação, que nos faz repassar informações para atender o apelo urgente de alguém e sem checar de onde essas informações vêm, suas fontes e seus conteúdos. Novamente, talvez isso possa revelar a pouca educação para a comunicação, sobretudo a falta do senso crítico.
Pedaço da Vila: Como melhorar esse senso crítico?
Helena Corazza: Essa é uma grande questão que gostaríamos de ter a resposta e talvez não a tenhamos. O que explica o sucesso de programas de TV que mostram as desgraças, que levam as pessoas a buscarem jornais com reportagens fotográficas do crime ou as mesmas notícias na plataforma digital? Há quem produza essas notícias porque deve contar com a audiência. Talvez – para reverter esse quadro – uma das formas seja não dar audiência; outra é manifestar-se criticamente e de forma organizada aos veículos que publicam. Informação de qualidade é um direito do cidadão.
Pedaço da Vila: A quem interessam as fake news?
Helena Corazza: Sabemos que há agências [de comunicação] especializadas que usam tecnologia sofisticada para produzir as fake news. Especialistas afirmam que a “desordem informacional” veio para ficar e que vai se tornar cada vez mais complexa. Tecnologias de inteligência artificial já são usadas para criar bots (robôs). Outras maneiras de mimetizar o comportamento humano estão ficando mais baratas, mais fáceis de usar e mais potentes.
Não há outro caminho a não ser o senso crítico, a busca de informações de modo a sermos sujeitos do processo, não nos deixando levar por mais este “modismo” que beneficia empresas e a quem quer ganhar dinheiro às custas do “entretenimento”. Creio que precisamos buscar o direito e o dever de sermos cidadãos perante a mídia, que é um bem e espaço público.
Pedaço da Vila: Quais as recomendações que a senhora dá para evitar ser enganado pelas Fake News?
Helena Corazza: O que vou dizer são alguns “cuidados” que já são largamente divulgados. Antes de compartilhar qualquer conteúdo, leia antes, cheque a data de publicação e a sua procedência. Normalmente, essas notícias falsas não são assinadas e são em tons alarmantes, atingem a reputação de personalidades, instituições ou denunciam crimes contra a nação. No texto, sempre verifique se o outro lado da história foi ouvido. Antes de compartilhar, procure saber o que está compartilhando. E, se estiver na dúvida, converse com outras pessoas.
Pedaço da Vila: Qual é o papel do jornalismo nesse cenário?
Helena Corazza: Precisamos de um jornalismo sem fingimentos. Eu penso num jornalismo sem slogans sensacionalistas e declarações bombásticas, num jornalismo feito por e para pessoas e considerando sempre o seu papel de serviço aos leitores, especialmente àqueles leitores que não têm voz, que são a maioria. O bom jornalismo é comprometido com a busca de soluções para os conflitos reais e deve estar empenhado na construção de alternativas à escalada da violência. Por isso, é preciso trabalhar em favor da educação e de políticas públicas que garantam direitos aos cidadãos, entre eles o de uma comunicação de qualidade.
Pedaço da Vila: A comunicação sempre foi a área de seu trabalho. Qual é a sua abordagem sobre o assunto?
Helena Corazza: As minhas publicações dizem respeito às áreas de pesquisa e atuação pastoral na formação de lideranças comunitárias. Entre outros livros que publiquei a respeito estão Educomunicação: formação na cultura digital; A comunicação nas celebrações litúrgicas; Pastoral da comunicação: diálogo entre fé e cultura (escrito em parceria com a professora Joana Puntel) e Acolher é comunicar. Nos próximos meses deve será publicado o livro Espiritualidade do comunicador cristão, que também foi escrito em parceria com a Joana Puntel.
Pedaço da Vila: Hoje, qual é o papel da comunicação para a Congregação Paulinas?
Helena Corazza: As irmãs Paulinas possuem uma editora multimídia, com livros, periódicos, produção de programas de rádio, CD’s, DVD’s, webtv, site… As produções são disponibilizadas de forma digital. Ela criou a primeira livraria digital no país e hoje possui dois departamentos. O primeiro é o Serviço de Animação Bíblica (SAB), na área bíblica, em Belo Horizonte (MG); o segundo é o Serviço à Pastoral da Comunicação (SEPAC), na área de comunicação, aqui na Vila Mariana. Ela também disponibiliza formação à distância na área de Bíblia, Catequese e Comunicação. A missão das Paulinas, segundo seu fundador Padre Tiago Alberione, é formar a mentalidade na sociedade, orientar para os valores humanos, cidadãos e cristão.