Jogada de Mestre

O primeiro-ministro da República de Vila Mariana, Walter Taverna, sabe como ninguém mobilizar imprensa e comunidade em torno de seus projetos. Ao trazer a tona o abandono do Parque Modernista, conquistou mais uma vitória: a secretária de Cultura do Estado, Cláudia Costin, anunciou que o importante patrimônio histórico, arquitetônico e cultural, localizado na rua Santa Cruz, nº 325, será reaberto dia 16 de agosto, com uma grande festa, promovida – é claro – por Taverna. A área de 13 mil metros quadrados – e fechada há cerca de 10 anos – abriga a primeira Casa Modernista (1927) da América Latina, assinada pelo arquiteto russo Gregori Warchavchic e um bosque projetado pela sua esposa, Mina Klabin, que em 1930 plantou no jardim apenas espécies brasileiras.

A propriedade, que pertencia à família Klabin, foi tombada em 20 de outubro de 1984, graças aos moradores do entorno que se mobilizaram em nome da Associação Pró-Parque Modernista contra a iniciativa de uma construtora em erguer ali um condomínio residencial . No dia em que assinou o tombamento, o então presidente da Câmara Municipal e, depois, secretário paulista de Cultura, Marcos Mendonça, planejou: “Mais tarde, os moradores poderão visitar a casa, ter acesso aos seus jardins e usufruírem das instalações do parque”. Só que o bem preservado –tombado pelas três instâncias – Federal, Estadual e Municipal – foi esquecido, invadido, depredado e fechado por questões de segurança: “Ligávamos para a polícia regularmente. Um dia, botaram até fogo na casa!”, conta dona Maria Lúcia Ribeiro de Souza, antiga secretária da associação Pró-Parque. Maria Lúcia relembra com saudades de quando os moradores promoviam recitais, peças teatrais e concertos nos fins de semana: “Agora tenho esperanças de voltar a ver a casa como nos velhos tempos”, alegra-se. Desde 1994, a Secretaria da Cultura isolou o parque, proibindo a entrada de todo cidadão: arquitetos, fotógrafos, estudantes e vizinhança, interessados em conhecer o primeiro exemplar modernista, considerado um representante da memória da arquitetura nacional e sua grande área verde – e pública – abandonados.

Em 1998, a recuperação do imóvel foi retomada. No entanto, o Ministério Público vetou a obra, alegando que, por ser um patrimônio histórico, seria necessário o restauro e não apenas reparos. No ano passado, a Secretaria da Cultura anunciou a disposição de retomar a reforma da casa, depois de uma visita de Cláudia Costin à propriedade. Mas, por não haver projeto de restauro, arquitetos mobilizaram-se e, em debate no IAB-SP, conseguiram obter do presidente do Condephaat o compromisso de interferir junto à construtora para que a obra não fosse realizada sem o devido projeto. E enquanto poder público, arquitetos e interessados discutiam o destino do imóvel, ele ia se deteriorando: “A casa está sem portas, janelas e pisos, cheia de infiltrações e seu telhado está caindo”, destaca Taverna. Os leitores do Pedaço da Vila sabem que Walter Taverna é um promotor cultural nato, que vive de transformar idéias em realizações.

Percebendo o estado do imóvel, a insatisfação dos moradores e a boa-vontade dos políticos em ano de eleições, enviou um projeto à secretária em nome da SODEPRO – Sociedade de Defesa e Progresso da Vila Mariana. Solicitou que o parque fosse devolvido à comunidade que se responsabilizaria em captar recursos e fazer dali um Centro de Cultura e Lazer. Em contrapartida, divulgou o fato à imprensa e agentes culturais da região, convidando-os para um abraço ao parque, o que aconteceu no dia 28 de junho. Com a bandeira da República de Vila Mariana em riste, Walter Taverna deu declarações, distribuiu o projeto e liderou o abraço.

A mobilização foi até capa de alguns jornais de bairro e assunto para veículos de grande imprensa. Isso bastou para, em menos de um mês, a secretária da Cultura do Estado convocar imprensa e comunidade para informar que, a partir do dia 16 de agosto, o Parque Modernista será aberto ao público com “vocação de espaço cultural”, afirmou na oportunidade. A grande notícia foi dada no local – na frente de uma Casa Modernista totalmente deteriorada. Logo cedo, nesse dia, o portão foi aberto para trabalhadores, que fizeram a limpeza e iniciaram as obras.

Assessores da secretaria da Cultura e do Meio Ambiente estudavam o estado das coisas e os seguranças, que no dia do abraço não saíram detrás do portão fechado, recepcionavam imprensa, representantes do Fórum de Cultura de Vila Mariana e antigos representantes da Associação Pró Parque Modernista, com ares de satisfação: “Esse lugar vai ficar mais bonito quando for aberto ao público”, suspirou Alex Sandro de Almeida Silva, no instante em que a placa de “Proibida a Entrada” foi retirada do portão por um dos operários. Segundo Cláudia Costin, a abertura do espaço será feita em etapas.  Com um investimento de R$ 200 mil, as secretarias de Cultura e Meio Ambiente pretendem proteger as áreas originais de vegetação, com adoção de medidas de se- gurança, identificação das plantas existentes  e dos  pontos  de  destaque  no  caminho: casa das crianças, casa das bonecas, garagem, horta original etc. “Vamos trabalhar para reconstituir o jardim em sua forma original, disse o arquiteto e paisagista Arnaldo Rentes, destacado pela Secretaria do Meio-Ambiente Será  feita ainda recuperação e adequação da pista existente para caminhada e proteção das edificações para o público, além de medidas de segurança para os visitantes que incluirão tapumes na casa principal e na piscina:” Vamos identificar as árvores para que as pessoas as conheçam e preservem “, disse a Secretária.

Entre as novidades que serão implantadas  nessa  primeira  fase, custeada inteiramente pelo Governo do Estado, destacam-se  as oficinas culturais regulares de Serralheria Artística, Marcenaria, Jardinagem/Paisagismo  e Pensando a Recuperação, “que terá o propósito de repensar o que aconteceu com o imóvel e o que poderá ser feito daqui para frente”, explicou Cláudia Costin. O objetivo dos cursos é  aproveitar  o  espaço  em  benefício  da própria restauração das áreas degradadas: ”As oficinas culturais recuperarão a parte de marcenaria e jardim. Vamos, com isso, adiantar bastante e, no decorrer, tentaremos conquistar eventuais parceiros”, informou Cláudia Costin. Na segunda fase da reforma, está prevista a edificação do alojamento dos serviçais e da Casa de Bonecas e o planejamento de Oficina de Restauro de Brinquedos Antigos.

O  último ponto do projeto refere-se  ao  restauro  da  casa  principal e está avaliado em 1 milhão de reais. Para isso, foi estabelecido um plano  de  captação  de recursos e as formas de utilização pelo público – museu, biblioteca, exposições etc. “Se não conseguirmos parcerias, a própria Secretaria da Cultura irá bancar”, compromete-se a secretária. A estimativa é que o parque esteja pronto até o final de 2005. Um conselho de gestão será criado com a participação do Fórum de Cultura Vila Mariana, que se colocou à disposição da Secretaria da Cultura. Tudo isso sob a vigilância de Walter Taverna: “Não é o morador da Lapa que vai cuidar dos patrimônios da Vila Mariana. Cabe a nós, moradores do bairro, o dever de zelar e o direito de usufruir desses espaços públicos!”, ensina Taverna, que convida todos para comer um pedaço de bolo no dia da reabertura do Parque Modernista, 16 de agosto, às 10h30.