Ailton Pinto Alves Filho

PedaçodaVila: Desde quando o Planeta vem sentido os efeitos da civilização?

Ailton Pinto Alves Filho: Catástrofes ambientais provocadas pelo homem, inclusive as relacionadas com o clima, estão relatadas nos livros de história e ocorrem desde a Antiguidade. O que mudou daqueles tempos para os nossos dias, é que hoje o ser humano é capaz de promover a degradação ambiental em escala planetária. Ulrich Beck, um importante sociólogo alemão, denomina o momento atual de nossa civilização como o da “Sociedade de Risco”. Temos não só a globalização da economia, mas também a “globalização dos problemas ambientais”. E dos riscos decorrentes. Mas a percepção deste fenômeno, ou seja, o da “capacidade” do ser humano provocar alterações ambientais no planeta como um todo, só iria se intensificar, a partir da década de setenta. A publicação de vários relatórios, alguns inclusive alguns assinados pela ONU, passaram a confirmar a existência de fenômenos de alterações significativas nos grandes sistemas do planeta, como o atmosférico. Estes fenômenos passaram a ser denominados genericamente de “Global Changes” (Mudanças Globais). O que está hoje em maior destaque, inclusive na mídia, é uma parte deste fenômeno, que é denominado de “Climate Changes” (Mudanças Climáticas). Porém, o fenômeno em si, é mais antigo. Observações meteorológicas feitas no mundo todo indicam que o processo de aquecimento iniciou-se a partir da segunda metade do século XIX, com as emissões decorrentes da queima de combustíveis fósseis. Porém, o aquecimento intensificou-se muito nos últimos vinte anos, como indicam os relatórios do IPCC (Painel Intergovenamental Sobre Mudanças Climáticas), que é um órgão ligado a WMO (World Meteorological Organization).

P.daVila: Oaquecimento global é culpa única e exclusiva do ser humano?

A.P.A.F.: Atividades biológicas decorrentes da fermentação ou respiração geram gases estufa, o que é fundamental, pois do contrário, a temperatura da troposfera terrestre (porção da atmosfera onde vivemos) seria extremamente baixa, cerca de -30º C. Porém, a queima de combustíveis fósseis e de biomassa – as queimadas da Floresta Amazônica, por exemplo – elevaram a concentrações desses gases na atmosfera acima do limite “normal”. Estudos apontam que desde o Pleistoceno, ou seja, nos últimos 400.000 mil anos, a concentração de CO2 nunca atingiu a marca atual, que é de cerca de 400 ppm (partes por milhão) de CO2. Porém, outros fatores não antrópicos (relativos ao ser humano) poderão estar contribuindo para o aquecimento. Mas é muito difícil uma afirmação categórica, pois a quantidade de radiação solar sobre a Terra pode variar. Por exemplo: houve um período de grande aquecimento da Terra durante uma parte da Idade Média e uma mini-glaciação na Europa no século XVI, como apontam alguns estudos europeus. Pesquisas da Universidade do Minho, em Portugal, indicam que neste período ocorreram intensos episódios de nevascas anuais em Lisboa – hoje este fenômeno é muito raro (houve neve em Lisboa em 1956 e depois, somente em 2006). Mas hoje, até os cientistas mais céticos não têm como negar os fatos, alterações climáticas importantes, como o recuo das geleiras, estão ocorrendo com uma velocidade impressionante. Transformações no planeta que deveriam ocorrer na escala de milhares de anos estão acontecendo em décadas.

P.daVila: Fale sobre o clima de São Paulo

A.P.A.F.: A cidade de São Paulo e a maior parte da Região Metropolitana têm seu “aquecimento particular”, que é inclusive muito mais intenso do que o planetário. Com tanta exposição na mídia sobre as mudanças climáticas, noto que muitas pessoas estão hoje atribuindo a culpa ao “tal do aquecimento global”, para seu desconforto térmico. Possivelmente este excesso de calor se deve, em maior grau, a causas locais. Enquanto se fala em aumento da temperatura global em 0,7ºC até os dias de hoje, a temperatura média da cidade de São Paulo já subiu mais de 3ºC. Além disso, as temperaturas médias mínimas se elevaram muito. Isto tem conseqüências ambientais muito sérias, como por exemplo, as enchentes.O aumento da temperatura nas cidades é provocado por diversas fontes: ausência de áreas verdes, solo impermeabilizado, edificações e asfalto que irradiam calor e gases estufa produzidos pela cidade. O NO2 (Dióxido de Nitrogênio), por exemplo, é proveniente dos escapamentos de caminhões e ônibus, já o CO (monóxido de carbono) é produzido principalmente pelos carros. Estas são chamadas fontes móveis. Temos também os lixões que produzem metano e as indústrias que emitem diversos poluentes atmosféricos. Não é a toa que as cidades aquecem tanto. Este calor provoca uma circulação específica das cidades, já muito estudada, denominada ilha de calor urbana.

P.daVila:As enchentes são consequências destes efeitos?

A.P.A.F: São sim.Todo o calor acumulado na cidade durante o dia promove a convecção vespertina, ou seja, ascensão do ar mais quente e mais leve para camadas mais elevadas e mais frias da atmosfera. Daí há a condensação do vapor d´água  presente na atmosfera, sobretudo no verão, provocando, de acordo com as condições atmosféricas, chuvas de grande intensidade. Além disso, São Paulo encontra-se numa posição muito próxima do litoral. Se traçarmos uma linha reta, são cerca de 40 km de distância, por isso sofre influência da circulação marítima. A brisa oceânica penetra à tarde no planalto paulistano, trazendo umidade e sais (que são elementos higroscópicos- ou seja , que favorecem a condensação das nuvens). Se a brisa atinge a cidade logo após o período de maior aquecimento, poderemos a intensificação do fenômeno com a formação de pancadas de chuvas intensas. O mecanismo de ilha de calor interagindo com esta brisa pode ser perverso, sobretudo no verão. A forma totalmente caótica como São Paulo cresceu, com toda a superfície praticamente impermeabilizada e com uma bacia hidrográfica (Bacia do Alto Tietê) toda represada dentro dela, ajuda muito na potencialização dos efeitos destas chuvas.

E haja investimento para evitá-las!!! . Quanto de todo este dinheiro que é usado para combater enchentes, não poderia estar sendo usado para educação, ou para melhorar qualidade de vida do paulistano, não é mesmo? Se pararmos para pensar no modelo de cidade é algo totalmente irracional.

P.daVila: E o clima da Vila Mariana?

A.P.A.F.: A Vila Mariana é um dos bairros mais quentes de São Paulo, por causa da exposição de uma das vertentes do espigão da Paulista (onde está assentado o bairro) ao sol. Ou seja, a Vila Mariana é um bairro “face norte”, que recebe uma insolação muito maior do que, por exemplo, a Aclimação que está situada na outra vertente do espigão da Paulista. Além disso, a verticalização do bairro impede a ventilação e, portanto, a troca de calor. Este é também um componente importante para o aquecimento do bairro. Por outro lado, o Parque do Ibirapuera e o Instituto Biológico que deveriam fazer o papel de “ar condicionado natural” do bairro estão, infelizmente, sendo cada vez mais circundados por prédios que servem de anteparo a esta ventilação. O tombamento das áreas em torno do Instituto biológico pode ser exemplo de medidas que minimizariam o problema do aquecimento para todo o bairro. Mas esta medida é criticada por muita gente, que quer ganhar com a especulação imobiliária.

P.daVila: Como se manifestará o Aquecimento Global no Brasil e como contê-lo?

A.P.A.F.: No Brasil a coisa poderá ser muito séria. Quase todos os modelos matemáticos gerados por laboratórios climatológicos apontam redução das chuvas e o aquecimento para extensa faixa intertropical, que engloba no Brasil, principalmente o Nordeste e Amazônia. Mas o pior é problema gerado aqui no Brasil mesmo. As pesquisas realizadas até agora pelo LBA – Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia, que envolve a comunidade científica nacional e internacional, estão mostrando, entre outras coisas, que a queima da floresta pode afetar o clima da região, com a mudança no padrão das chuvas, por exemplo. As conseqüências disto, é que todo o clima da América do Sul pode ser afetado, pois, grande parte do regime de chuvas do continente depende da umidade proveniente da Amazônia, sobretudo do verão. O que era apenas uma hipótese está agora se confirmando com o LBA. Se o Brasil tem algo a fazer para combater o aquecimento global, isso transpassa, sem dúvida, o ato de impedir o desmatamento e a queima das nossas florestas.

P.daVila: Quanto ao Protocolo de Kyoto e novas medidas para conter a emissão de gases.

A.P.A.F.: O cumprimento do Protocolo de Kyoto, em minha opinião sincera, não vai contribuir com quase nada. O que ele tem de importante é o compromisso assumido pelas nações desenvolvidas (com exceção dos EUA), para combate o aquecimento global. A União Européia já estuda hoje elevar os compromissos de redução das emissões. O Protocolo de Kyoto prevê a redução das emissões em torno de 5,2 % tendo como base 1990. Mas hoje se estima que, para ter efeito prático, as reduções teriam que ser de no mínimo 50% e em escala planetária. Estamos muito longe disso.

P.daVila: E sobre as compensações ambientais, elas são eficientes até que ponto?

A.P.A.F.: Leis que promovem a compensação ambiental existem no mundo todo, inclusive estão previstas em vários casos, na nossa legislação (federal, estadual ou municipal). O que o Protocolo trouxe de novidade foi a inauguração de um sistema de compensações internacionais. A compensação ambiental que mais nos interessa é aquela que permite aos países desenvolvidos que assinaram o Protocolo de Kyoto – que estão no chamado anexo I do Protocolo – investir em projetos que reduzam o aquecimento global em países como o Brasil. Este mecanismo é muito importante, pois permite a entrada de recursos financeiros e de tecnologia para projetos ambientais. O Brasil só tende a ganhar com isso. Mas existem alguns problemas: como o carbono evitado passa a ser uma moeda de troca, na prática ele vira dinheiro. Temos de impedir que se esqueça o real intuito deste mecanismo, que é evitar o aquecimento global, de modo ao não promover apenas o “aquecimento das contas bancárias” dos detentores destes projetos. Um exemplo da complexidade desta questão está no aterro Bandeirantes situado em Caieras, na Grande São Paulo. O gás metano produzido no aterro que iria para atmosfera está sendo utilizado para gerar energia. O carbono evitado está sendo vendido com créditos de carbono. Porém a manutenção deste aterro, já esgotado, gera problemas ambientais importantes no seu entorno e é alvo de ações no Ministério Público Estadual.

P.daVila:Faça uma previsão negativa e uma positiva para o futuro…

A.P.A.F.: A preocupação com a questão ambiental e climática do planeta é de certa forma cíclica.

Ocorrem períodos de grande exposição na mídia destas questões, com outros onde esta preocupação esmorece. Nos períodos de “alta”, aumenta o debate em torno do assunto, que favorecem a criação de leis e de novas tecnologias, depois muita coisa é esquecida ou fica para segundo plano.

Mas acredito que estamos iniciando outros tempos. Com o surgimento das redes de comunicações global, a divulgação de experimentos científicos online e a pressão da opinião pública, que ocorrendo de forma sistemática e permanente, talvez este quadro possa mudar. Acredito, sinceramente, que os mesmos mecanismos que tem impulsionado transformações na nossa sociedade, possam contribuir para alterar também o modelo de desenvolvimento. Não é tarefa fácil, pois grande parte da modernidade foi erguida em cima da revolução industrial e do uso de combustíveis fósseis, primeiro sólidos (carvão) depois líquidos (petróleo). Para mudarmos para combustíveis gasosos (como o nitrogênio) ou fontes renováveis como energia solar, terá de haver uma mudança de paradigma. Com certeza, quanto mais soubermos sobre o aquecimento global (ou mesmo local) e pudermos divulgar e discutir o assunto, mais chances teremos, de pressionar por mudanças.

Edição 59 – Mar/2007

196 comentários sobre “Ailton Pinto Alves Filho

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