Luz no Fim do Túnel
Com vistas a 2014, a prefeitura pretende transformar a capital paulista num canteiro de obras para receber a Copa do Mundo. Na Vila Mariana, o cenário promete sofrer transformações. Além da expansão das linhas do metrô, duas outras intervenções viárias, que também integram o pacote de benfeitorias do poder público para o Mundial de futebol, proporcionarão mudanças consideráveis no bairro. Trata-se da construção, ainda em fase de projeto e pré-qualificação de licitação, de dois túneis: um na rua Sena Madureira com ligação à avenida Ricardo Jafet; e outro como continuação do já existente túnel Ayrton Senna até o sentido centro da avenida 23 de Maio.
Ambas as execuções têm como objetivo melhorar a fluidez do trânsito na região. Por outro lado, podem causar transtornos à vizinhança com uma série de interdições, barulho e rachaduras causadas pelas escavações e até desapropriações de imóveis.
No caso da extensão do túnel Aryton Senna, a obra deverá ser a mais complexa. A partir de um entroncamento com o formato da letra Y já existente dentro da passagem subterrânea, será construído um novo trecho de aproximadamente 500 metros, com duas faixas de tráfego de 3,65 metros cada e calçadas de um metro de largura.
Pelo projeto, também estão previstas duas faixas adicionais no sentido centro da 23 de Maio com cerca de 1 km de extensão, a partir da Rua Joinville, para dar segurança à transição feita pelos motoristas. Além disso, deverão ser feitas obras de contenção e ampliação de faixas nos viadutos Tutóia e Eng. Antonio de Carvalho Aguiar, bem como nas ruas Joinvile, Artur de Almeida, Coronel Oscar Porto e Estela. Ao mesmo tempo, uma terceira via alternativa, que contornará o túnel, será implantada para facilitar a circulação do transporte coletivo.
De acordo com a prefeitura, o principal benefício da megaobra será acabar com o congestionamento formado na saída do Túnel Ayrton Senna, quando os motoristas precisam passar pela rua Senna Madureira e avenida Pedro Álvares Cabral para chegar à avenida 23 de Maio. No entanto, para criar o novo acesso à 23 de Maio rumo ao centro, a prefeitura terá de desocupar uma área de 6.050 m² na Vila Mariana. Para isso, será necessário até elaborar um Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima). As áreas arborizadas atingidas deverão ser compensadas ou replantadas. Por enquanto, o decreto com as desapropriações já foi publicado no começo de junho no Diário Oficial do Município.
Três áreas do bairro serão afetadas. A maior delas mede 3.726 m². E as demais têm dimensões de 2.132m² e 201 m². As ruas Doutor Astolfo Araújo e Victor Brecheret, além da própria Avenida 23 de Maio,estão entre os locais com futuro incerto.
A Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb), a cargo das obras, não confirma os endereços nem a quantidade de imóveis a serem desapropriados, pois informa não ter definido a planta expropriatória do projeto que ainda pode ser alterado. Com isso, poderá haver ajustes na área a ser desapropriada.
Porém, segundo informações que circulam pela vizinhança, alguns proprietários já teriam até sido notificados sobre as desapropriações dos imóveis. “Será necessária a desapropriação de 20 lotes inteiros (5858 m²), além de parte de um lote (201 m²), para o alargamento da avenida 23 de Maio e não propriamente a construção do túnel”, esclarece Fernando Vecchia, supervisor de planejamento urbano da Subprefeitura da Vila Mariana.
Assim como o novo trecho do túnel Ayrton Senna, a futura passagem subterrânea da rua Sena Madureira não possui prazos de construção. Já o valor de investimento foi estipulado em
R$ 148 milhões, em 2008. Quando pronta, eliminará o congestionado cruzamento do Pastorinho, na rua Domingo de Moraes. Conforme o projeto, haverá duas pistas com sentidos opostos, uma com 800 metros e outra com 1 km de extensão, que conectarão a Sena Madureira às ruas Vergueiro e Embuaçu e à avenida Ricardo Jafet.
Também está programada a remodelação da área externa lindeira à implantação do novo Complexo Sena Madureira. Tal etapa inclui readequação do sistema viário e contenções hidráulicas, além de implantação de um novo sistema de iluminação, sinalização e paisagismo. A prefeitura não quantifica o número de desapropriações necessárias.
As obras dos dois túneis realizadas simultaneamente na Vila Mariana podem apresentar pontos positivos e negativos. Um possível impacto prejudicial ocorre na superfície das passagens subterrâneas. “Se o fluxo de tráfego aflui para um lugar e, ao sair do túnel, complica outros lugares, gera problemas na fluidez do trânsito. É o que acontece hoje nos recentes túneis das avenidas Rebouças e Cidade Jardim, feitos com cruzamentos nos dois sentidos”, explica o arquiteto-urbanista Paulo Bastos.
Segundo ele, as largas rampas de entrada e saída dos túneis também podem ser um obstáculo a mais, já que eliminam a ligação de um lado para o outro da via. “Uma obra de túnel de grande porte não pode ter impacto negativo nem baixo custo benefício. Do contrário, haveria pouco benefício por muito custo”, pondera.
Por isso, o arquiteto ressalta que as conexões viárias de uma passagem subterrânea devem ser bem pensadas. “O principal benefício de um túnel é quando o tráfego de superfície em excesso de um lugar é desviado e ligado para outra via”, completa Bastos.
Fernando Vecchia explica que as duas obras em pauta na região foram sugeridas durante a elaboração dos Planos Regionais Estratégicos. “O túnel Ayrton Sena em uma primeira fase foi construído em um sentido, restando a obra no sentido oposto que está sendo iniciada. Ela é parte do complexo viário originalmente projetado. Já a transposição da Domingos de Morais pela Sena Madureira é um ponto de estrangulamento na região e sua melhoria é importante para o tráfego de toda a cidade”, defende o supervisor de planejamento urbano da Subprefeitura.
De acordo com estudo da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) da prefeitura, a Vila Mariana já é considerada um dos dez bairros saturados da cidade, um lugar onde há muito mais carros em circulação do que ruas com capacidade para abrigá-los. A situação piora quando motoristas mais apressados buscam ruas próximas, estritamente residenciais, para “cortar” caminho até as grandes avenidas.
O pedaço sofreu grande impacto com o desenvolvimento da cidade. Cercado por importantes vias – 23 de Maio, Vergueiro e Sena Madureira -, cada vez mais movimentadas, foi uma das regiões que mais recebeu lançamentos imobiliários e pólos geradores de tráfego, como escolas, universidades, shoppings, hospitais, entre outros estabelecimentos de médio e grande porte. A situação piorou com a inauguração do complexo Cebolinha, em 2002, que trouxe ainda mais carros para ruas até então tranquilas. A Copa do Mundo poderá ser uma luz no fim do túnel à Vila Mariana.