Nossa Campeã
Aos 16 anos, a vilamarianense Dora Varella coleciona títulos por onde passa e desponta-se como uma das principais revelações do skate no país. Seu talento sobre as quatro rodinhas conquistou a admiração de uma das principais lendas do esporte, o americano Christian Hosoi. “Ele me convidou para representar a sua equipe pela marca Hosoi Skateboards, e ainda me apresentou a sua fábrica, me deu dicas e, desde então, é ele quem faz os meus skates”, conta.
O skate sempre acompanhou os passos da vizinha. “Para mim, andar de skate é uma grande diversão, sempre foi um brinquedo presente na minha infância”. Ela começou a andar de skate para valer aos 10 anos. “Conheci algumas pistas, entre elas a da Saúde, do Jockey, do Bom Retino e de São Bernardo do Campo, e aí peguei gosto pelo bowl. Assistia muitos vídeos de skatistas para aprender a fazer as manobras”, revela.
Dora Varella estreou em campeonatos um ano depois, e rapidamente criou gosto pelas competições. Em 2015, o título de campeã brasileira na modalidade bowl carimbou seu passaporte para o tão sonhado mundial da Vans Girls Combi Pool Classic, um dos campeonatos mais almejados pelo skatistas do mundo inteiro. Na categoria abaixo de 14 anos, a vizinha fez bonito e posou para a foto no lugar mais alto do pódio. “Eu não me sentia no nível das outras skatistas. Então, fiz o meu melhor e ganhei. Até eu fiquei surpresa. Ali eu percebi que estava me dando bem”.
Nos bastidores das competições e na torcida estão os pais Paula e Marcelo, que ajudam a filha na busca por patrocinadores e recursos para bancar as viagens e hospedagens. “É sempre um perrengue, um corre-corre. Para que a Dora pudesse representar o Brasil na Califórnia em 2015, tivemos que fazer uma vaquinha e campanha online para arrecadar dinheiro. Procuramos muitas marcas para patrocinar, mas não conseguimos nenhuma”, diz a mãe.
Sua ida à Califórnia contou com a ajuda do Canal Off, que aproveitou a oportunidade para dar início a série Partiu, Skate! Protagonizada por Dora e suas amigas skatistas Yndiara Asp e Isadora Rodrigues. A primeira temporada do programa mostrou o universo do skate californiano e suas principais pistas. “ Sou fã do canal e sempre quis participar dele. Foi a realização de outro sonho”, agradece.
Para treinar aqui, no Brasil, também não é fácil, explica Dora. “Aqui no bairro eu treino às vezes na Bowlhouse Skateboards, na esquina da Rua Morgado de Mateus com a Avenida Conselheiro Rodrigues Alves. Mas sinto falta de uma pista maior aqui no bairro, no Ibirapuera, por exemplo. Para treinar eu preciso me deslocar muito. As pistas mais próximas são no bairro da Saúde, que nem sempre é segura — pois fica embaixo de um viaduto — a do Jockey, a do Bom Retiro e a de São Bernardo do Campo”.
Dora conta que o treino é tranquilo, mas que é preciso “quebrar muito a cabeça” para pensar numa série de manobras com alto índice de dificuldade e convencer os jurados. “Eu uso muito a cabeça. Antes de cada competição, eu passo em torno de três dias conhecendo a pista para me dar bem com ela e ter o melhor aproveitamento”.
Nos campeonatos, o principal desafio é não errar, ou, como se diz no jargão skatista, “ter a manobra no pé”. “O que mais vale na apresentação, normalmente, é a dificuldade das manobras e o aproveitamento de toda a pista. E isso todos os skatistas fazem. Eu sempre deixo a manobra mais difícil para a última volta e sempre procuro fazer manobras diferentes”.
Para a pequena campeã, o skate é antes de tudo uma diversão. “Desde que eu comecei a andar, sempre foi assim. Eu vejo os campeonatos como uma consequência dessa brincadeira. Mas eu também gosto muito de competir, pois me ajuda a evoluir e é sempre uma oportunidade de reencontrar os amigos e fazer novas amizades”, confessa.
Em 2016 Dora participou como suplente no maior evento de esportes radicais, os X-Games. Em janeiro deste ano, consagrou-se na Califórnia como campeã do Vans Girls Combi Pool Classic, pela segunda vez, agora na categoria acima de 15 anos. “
Após conquistar a etapa brasileira do Vans Park Serie, na Serra Negra, Dora foi ao topo da etapa continental da competição, realizada em julho deste ano na Califórnia. “Como eu tinha vencido a etapa nacional, entrei direito na final e venci”, conta ela.
A vitória garantiu à Dora representar o continente americano na grande final do Vans Park Series, na China. “Além das skatistas profissionais, estarão lá as cinco campeãs de cada continente. A pista de Shangai foi construída especialmente para essa competição. Ninguém ainda competiu nela”, informa.
Apesar de toda a pressão das competições, Dora diz que o segredo é focar em tudo o que foi treinado. “Dá um gelo, mas isso também me motiva e me faz acertar manobras que normalmente eu erro. Quando entro na pista, penso apenas que preciso fazer o que eu treinei e brincar de andar de skate”.
Preparando-se para as Olimpíadas
Dora está no páreo por uma vaga para representar o Brasil nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2020, justamente na edição que marca a estreia do skate no evento.
“Eu ainda não penso muito nisso, não mudei meu treinamento pensando nas Olimpíadas. Mas se eu conseguir uma vaga, terei que me dedicar ainda mais. A classificatória por uma vaga nos jogos olímpicos está prevista para 2019 “.
Para preparar os atletas para as Olimpíadas, a Confederação Brasileira de Skate (CBSk) precisa ser filiada ao Comitê Olímpico Internacional. Por não ser filiada, quem é responsável pelos skatistas brasileiros é a Confederação Brasileira de Hóquei sobre patins, reconhecida pela FIRS (Federação Internacional de Roller Sports). Por isso ainda está indefinido como se dará o processo de seleção para os jogos, pois foi negada à Confederação Brasileira de Skate (CBSk) o pedido de filiação ao Comitê Olímpico do Brasil (COB).
Em resposta à decisão, a CBSk lançou um abaixo-assinado online pedindo que seja ela a responsável pelo processo de treinamento dos skatistas brasileiros para os Jogos Olímpicos. Apoiada pelos principais nomes do skate, a petição conta com quase 18 mil assinaturas.
Enquanto isso, longe das burocracias institucionais, Dora continua conquistando o mundo e aproveitando para conhecê-lo. “Eu gosto de competir mundiais porque tenho a oportunidade de conhecer muitos países, como é o caso da China, por exemplo”.
Nossa campeã sabe que se for para as Olimpíadas precisará intensificar, o que considera brincadeira, para desbancar as americanas, que dispõem de melhores estruturas e condições de treino. “Eu estou no ensino médio, preciso estudar, e as pistas são distantes de casa. Para competir nas Olimpíadas, preciso treinar muito mais; ainda estou pensando nisso (risos)”, diz.
Para a moradora da Rua Pelotas, é a liberdade proporcionada pelo skate o que realmente tem valor. “Andar de skate é a minha forma de me expressar. O esporte me ajudou a criar um estilo e me fez conhecer muitas pessoas. No skate todos se respeitam; é um ambiente livre onde um ensina o outro e, quando alguém acerta uma manobra, todos vibram”, comemora a campeã.