Mikael Freitas

Mikael Freitas é um ativista nato. Formado em Biologia na USP , trabalhou no Greenpeace, na Escola de Ativismo e, há 4 anos, criou a ONG MAPAA, que resgata animais vítimas de maus-tratos. Ele ainda treina cães para serem cão-amigos na pet-terapia: visitas em hospitais e casas de repouso. Morador da Vila Mariana desde que nasceu, ele conseguiu, com a ajuda de dois amigos, consolidar a ONG e adquiriu um ônibus para transformá-lo em clínica móvel. A reforma já está pronta e a  MAPAA lançou uma campanha no site Kickante para comprar os  equipamentos cirúrgicos. Vamos ajudar?

Pedaço da Vila: Você é formado em biologia e trabalhou no Greenpeace. Quando esse seu lado ativista despertou e como foi desenvolvido?

Mikael Freitas: Meu lado ativista sempre existiu. Meus pais foram formados na USP em uma época de muito engajamento. Eu herdei esse lado deles. Sempre participei de grêmios de colégio e movimentos estudantis. Eu entrei na faculdade achando que eu iria trabalhar com botânica, e quando foi em 2009, no fim do segundo ano, um amigo me passou uma vaga de estagiário no Greenpeace; trabalhei na campanha de oceanos para a conservação marinha. Fiquei por dez meses lá, conhecendo como funcionava o trabalho por dentro. Deixei o Greenpeace e voltei para a faculdade e mudei de área, para o laboratório de evolução humana. Sempre fui  muito idealista e, se a gente quer mudar o planeta, é preciso entender o ser humano. Ao longo desse processo eu entrei numa outra organização, a Escola de Ativismo, onde fiquei por quase dois anos, e na ONG Alana, na época do Rio + 20. Entre 2011 e 2014, participei de uma série de projetos de ativismo e fui adquirindo experiência para então criar o Mapaa.

Pedaço da Vila: A Mapaa é uma ONG de resgate de animais criada por você. Como ela nasceu?

Mikael Freitas: O nome Mapaa significa Meio Ambiente e Proteção Animal. Como sou da biologia, para mim, meio ambiente e proteção animal sempre se integraram. Demorei para entender que a sociedade civil lida com isso de forma diferente, por isso a gente então optou por deixar claro no próprio nome da Ong. Começamos o trabalho como qualquer protetor independente, levando os bichos para casa, tirando dinheiro do bolso, arrumando briga com a família (risos). Em paralelo, fomos conseguindo parcerias para arrecadar fundos para o projeto. Dois amigos ajudaram e continuam ajudando muito a gente: o Henrique, que estudou comigo aqui no bairro, na escola Carandá, e a Virgínia, que nos deu todo o respaldo institucional para a Mapaa operar seus trabalhos. 

Pedaço da Vila: Qual é a estrutura da Mapaa hoje?

Mikael Freitas: Em termos de materiais físicos, temos um carro, o ônibus da futura clínica móvel e o escritório. A ideia dessa clínica móvel é atender áreas mais periféricas. Nosso trabalho funciona no formato de parceria. Temos parceria de marketing, que é quem faz a captação de recursos; com a assessoria de imprensa e relações públicas; temos espaço em dois canis, um no Embu das Artes e outro, aqui, no bairro; temos ajuda para a contabilidade e área financeira, e também com os veterinários. Também temos uma parceria com o Google: fazemos parte do programa Google For Non-Profits, que nos possibilita divulgar nosso trabalho na internet. E contamos com um pequeno grupo de voluntários. Temos a sorte de termos bons parceiros. 

Pedaço da Vila: De que maneira se dá o trabalho da Mapaa e no que ela se diferencia das outras ONGs de proteção animal?

Mikael Freitas: O primeiro diferencial para as outras entidades é que a Mapaa atende as denúncias e faz o resgate. A gente mantém um contato com o público, recebemos denúncias todos os dias — são histórias absurdas… Desde o início não queríamos transformar  a ONG em um canil e con-seguimos parceiros para ficar com os cachorros que resgatamos. Em breve, colocaremos nas ruas a nossa clínica móvel, que já está quase pronta! No final do ano passado, conseguimos comprar um ônibus e estamos, com a orientação do Conselho Regional de Medicina Veterinária, transformando-o em clínica móvel. O projeto já está pronto, há um ambulatório, uma sala cirúrgica, um pós-cirúrgico e uma sala de higienização de equipamentos. Mas ainda não temos os equipamentos cirúrgicos. Para comprá-los, lançamos uma campanha online para arrecadar recursos. 

Pedaço da Vila: Como a ONG é mantida?

Mikael Freitas: Ela vive de doações de pessoas físicas, que é a forma, em nosso entendimento, que permite a nossa liberdade de atuação. Quem quer colaborar com a Mapaa recebe um boleto em casa, sem valor fixo, e pode ajudar com o valor que puder. A gente conquistou independência financeira com o projeto Cão-Amigo. Foi esse projeto que despertou nos colaboradores a sensibilidade para os trabalhos realizados pelo Mapaa. 

Pedaço da Vila: Esse é o projeto que a Mapaa mantém do cão terapeuta? De que maneira esse trabalho é realizado?

Mikael Freitas: O nosso projeto Cão-Amigo teve início em 2013 por meio de uma parceria com a Fundação de Medicina da Uni ABC. Tínhamos o doutor Givago, nosso primeiro cão-amigo. Na época nosso entendimento era o de que o pet-terapia deveria ser apenas com uma raça específica, o Golden. A gente visitava, ao lado do Givago, as crianças da oncologia pediátrica, no ABC. Foi um grande sucesso. Dali, fomos expandindo. No ano passado visitamos oito instituições, quatro por semana. Só que percebemos estava sendo estressante para o cachorro e decidimos reduzir as visitas. Atendemos hoje três instituições. O doutor Givago hoje está aposentado e vive com uma veterinária. Trabalhamos atualmente com a “doutora Celeste”, uma vira-lata que veio de resgate. Não pegamos por raça para fazer esse trabalho, mas por perfil: cachorros mais calmos e que interagem mais com as pessoas, os que são mais carinhosos. É uma outra forma de mostrar os benefícios dos animais na vida das pessoas.

Pedaço da Vila: É possível apontar o perfil de pessoas que maltratam animais?

Mikael Freitas: É um espectro e é difícil reduzir a um único lugar. A pessoa que faz atrocidade está muito além daquilo que chamamos de social, em termos de convívio. Teve aquela história clássica de uma mãe, em Goiás, que matou o cachorro na frente da filha. Os níveis de violência contra os animais são muitos e assustadores. Não existe um denominador muito claro. Nessa semana eu fiz um resgate de uma pessoa que se declara protetora de animais. O que a gente vê, de modo geral, é que são pessoas que têm uma carência afetiva gigantesca e não tem vínculos sociais. E essa pessoa acaba depositando tudo no animal. Ela vai tirar os animais da rua e colocá-los dentro de um quartinho, como uma mulher fez aqui no bairro, ao lado da Caixa D’água, com sujeira, sem comida, sem veterinário. Agora, a pessoa que maltrata com paulada, facada, e coisas dessa natureza, isso, para mim, é um sociopata. 

Pedaço da Vila: A Mapaa realiza quantos resgates por mês e qual o índice de adoção desses animais?

Mikael Freitas: Nós trabalhamos o resgate em conjunto com a adoção. Nosso maior parceiro é um canil que tem em Embu, numa área muito ampla, onde temos 10 vagas. Para não virar um canil, a gente coloca essa barreira, e só resgata quando adota. Vamos abrindo vaga e colocando outro. Tem mês que não fazemos nenhum resgate e tem mês que fazemos até 10 resgates. Hoje estamos lotados, com 26 cachorros, mas a adoção acontece bastante. Todo mês realizamos evento de adoção. 

Pedaço da Vila: Quais são os casos mais recorrentes atendidos pela Mapaa?

Mikael Freitas: Uma coisa que acontece diariamente é recebermos ligação de pessoas que estão se mudando, e não querem levar seus animais, pedindo para a gente recolher; eles são abandonados na casa ou até em apartamento! Muita gente que tem animal doméstico em casa não sabe cuidar dele, não conhece os comportamentos do cachorro, do gato, não sabe o que eles estão precisando. Os resgastes são sempre diferentes e muito tensos, pois vemos de tudo. Agora estamos produzindo um material para ensinar as pessoas a fazer resgates e a denunciar maus-tratos. É preciso denunciar, sempre! Um ponto que trabalhamos também é o lado educativo sobre como cuidar dos animais, pois existe muita ignorância. Muitas pessoas têm animal, mas não leva para passear, deixando ele preso em local muito pequeno. Isso ocorre em todos os lugares e classes sociais. 

Pedaço da Vila: A legislação que temos hoje consegue dar conta da realidade do maltrato aos animais?

Mikael Freitas: A legislação não é forte. Se o animal morrer, talvez a pessoa vá presa. A lei de maltrato ao animal é estadual, mas ela pode ser enquadrada como crime ambiental, passando a ser da esfera Federal. A pena máxima de reclusão para quem comete esse crime, em nível considerado hediondo, que é a morte, é de dois anos, mas, nesse caso, ela dificilmente irá presa. A lei é muito branda. O número de crimes contra animais é tão grande que, se todas as pessoas fossem presas, teria que construir mais presídios. Hoje existem muitas denúncias de que o controle de zoonose sacrifica animais. Sobre a legislação, não existe o mínimo amparo legal para cuidar de animais. A lei precisa evoluir muito nesse aspecto. Tem projetos, mas ficam parados sem perspectivas de que sejam retomados. Falta também um trabalho conjunto da sociedade civil para melhorar a situação, existem muitos conflitos e vaidades internas, que se tornam mais uma barreira.

Pedaço da Vila: Como conhecer e ajudar o trabalho realizado pelo Mapaa e colaborar com a clínica móvel? 

Mikael Freitas: Podem nos encontrar pelas redes sociais e site. Há três grandes formas de ajudar: a primeira é contribuir na divulgação das feiras de adoção de animais. A segunda é sendo voluntariado, pois às vezes precisamos de gente para transporte, feiras… A terceira é por meio de doações, seja por recursos financeiros ou materiais, como cobertor, potinhos, ração. E hoje todos podem ajudar no crowfunding para finalizarmos a nossa clínica móvel, que fará atendimento em regiões mais periféricas.

www.mapaa.org.br

www.facebook.com/Instituto MAPAA

Campanha de captação para a clínica móvel:www.kickante.com.br/MAPAA